Polêmica

Ernesto Araújo volta a defender que nazismo foi um ‘fenômeno de esquerda’

Chanceler brasileiro publicou texto sobre o assunto em seu blog. Teoria é criticada por historiadores e repercutiu mal na Alemanha

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, publicou, neste sábado, texto em seu blog no qual volta a fazer referência a sua teoria de que o nazismo é um “fenômeno de esquerda”. Ele já havia defendido a ideia em 2017, em uma publicação que foi resgatada e ganhou destaque na campanha eleitoral no ano passado. Ele repetiu a declaração em entrevista a um canal em uma rede social, no último dia 17. O discurso de Araújo foi criticado por historiadores e políticos.

O texto foi publicado no “Metapolítica 17”, apresentado como blog do ministro. Ele começa dizendo que a sua declaração causa pavor à esquerda, dando “a impressão de que existe aí um perigoso segredo de família, cuidadosamente guardado”. E insiste: “podemos facilmente notar que o nazismo tinha traços fundamentais que recomendam classificá-lo na esquerda no espectro político”.

“O nazismo era anti-capitalista, anti-religioso, coletivista, contrário à liberdade individual, promovia a censura e o controle do pensamento pela propaganda e lavagem cerebral, era contrário às estruturas tradicionais da sociedade. Tudo isso o caracteriza como um movimento de esquerda”, escreve Araújo.

No ano passado, depois de um artigo escrito pelo ministro em 2017 com a mesma ideia se tornar público, o embaixador da Alemanha no Brasil, Georg Witschel, afirmou ao GLOBO que a declaração de que o nazismo era de esquerda “é uma besteira” .

— É uma besteira argumentar que o fascismo e o nazismo são movimentos da esquerda. Isso não é fundamentado, é um erro, é simplesmente uma besteira — analisou Witschel, em outubro de 2018. — Isso é um fato bem fundamentado na História. É um consenso entre os historiadores da Alemanha e do mundo que o nazismo foi um movimento de extrema direita.

No texto publicado neste sábado, Araújo lista o que crê serem as características do nazismo e, em seguida, resume que ele “era anti-liberal e anti-conservador”. “A esquerda também é anti-liberal e anti-conservadora. Já a direita foi em alguns casos anti-liberal (durante o Século XIX na Europa, por exemplo), em outros casos anti-conservadora (ou pelo menos não-conservadora, indiferente aos valores conservadores, como no caso do neoliberalismo recente), mas nunca foi anti-liberal e anti-conservadora ao mesmo tempo. Em tal sentido, o nazismo se sente muito mais confortável no campo da esquerda do que no da direita”, comenta.

Para Araújo, o “resultado final do conflito mundial desencadeado pelo nazismo foi excelente para a esquerda”. Ele diz que a consequência supostamente positiva para a esquerda foi “um mundo em grande parte dominado pelo comunismo e uma cisão completa entre direita liberal e direita conservadora, com esta última humilhada e demonizada”.

O ministro defende ainda na publicação que a “grande tarefa do nosso tempo” é substituir o “amálgama esquerdista-liberal” por um “amálgama liberal-conservador”, em que “o anseio de uma economia aberta e a defesa das liberdades individuais se somam à promoção dos valores do patriotismo, da fé e da família”. Araújo diz que a direita “ao mesmo tempo liberal e conservadora” está surgindo no Brasil e em outros países como Polônia, Hungria e Estados Unidos.

Para ele, a esquerda tem pânico dessa direita liberal-conservadora, “pois o reconhece como seu grande adversário”. “Enquanto lutar somente contra o liberalismo ou somente contra o conservadorismo, a esquerda sempre levará vantagem, e portanto é isso que ela quer. A liga liberal-conservadora produz um aço firme, capaz de enfrentar a esquerda mesmo com o domínio que esta criou sobre a mídia e a academia”, escreve.

Além de ter sido criticada por historiadores brasileiros, a teoria do ministro repercutiu mal na principal emissora de TV pública da Alemanha, a Deutsche Welle.  Em texto publicado  na quinta-feira, na versão do seu site em português, a emissora diz que esse é o “absurdo que virou discurso oficial em Brasília”. “A estratégia de tentar classificar o nazismo como uma ideologia de esquerda não é nova e chegou a ocorrer no passado em vários países. Mas nunca chegou a virar um debate sério entre especialistas”, diz o texto.