Ex-feminista que criou Congresso Antifeminista vai atuar em pasta de Damares
A chegada de Sara Winter, 26, à Secretaria Nacional de Política para Mulheres engrossa o…
A chegada de Sara Winter, 26, à Secretaria Nacional de Política para Mulheres engrossa o caldo antifeminista na pasta sob guarda de Damares Alves, ministra evangélica que virou ministra de Jair Bolsonaro. Fundadora do Femen Brasil, grupo famoso por protestar de topless, e depois convertida ao conservadorismo, Sara foi convidada pela ministra para coordenar políticas para a maternidade.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, Damares disse que a ativista pró-vida vai ocupar um cargo de nível baixo [a categoria comissionada chamada de DAS 3, com salário de cerca de R$ 6.000] e “atuar no atendimento de mulheres em situação de risco”. Sara topou e, para se confirmada no cargo, espera seu nome passar pelo escrutínio interno de praxe. “Já fiz tanta coisa errada na vida, vai que a Abin não aprova meu nome”, brinca a ex-feminista arrependida.
A área em que trabalhará é integrada ao Ministério de Mulher, Família e Direitos Humanos, comandado por quem agora tem como “mãe adotiva” mas, no passado feminista que hoje lhe dá calafrio, era tida como “uma inimiga, uma aliada do sistema patriarcal e machista”.
Sara e Damares têm um tanto em comum, diz à reportagem, que a futura funcionária a serviço do governo Jair Bolsonaro, que concorreu à Câmara dos Deputados pelo DEM-RJ -com 17,2 mil votos, não se elegeu.
Veja só: católica, a jovem de São Carlos (SP) organizou em 2018 o 1º Congresso Antifeminista. O aborto foi tema central do encontro, que trazia bonequinhos de fetos na mesa do coffee break e reuniu 300 pessoas numa igreja carioca com o nome da avó de Jesus, Sant’Ana.
Uma das convidadas no seminário que discutiu temas como aborto foi Ana Caroline Campagnolo, autodefinida “antimarxista, antifeminista e cristã” e hoje deputada estadual pelo PSL catarinense. Ana Caroline virou xodó de conservadores ao processar a orientadora de mestrado, que desistiu de supervisionar seu projeto “Virgindade e Família: A Mudança de Costumes e o Papel da Mulher Percebido Através da Análise de Discursos em Inquéritos Policiais da Comarca de Chapecó”, e mais recentemente por incentivar que alunos denunciassem professores que vissem como doutrinadores ideológicos.
Também Damares, para quem a mulher nasceu para ser mãe, é crítica ao feminismo. “Sabe por que elas [as feministas] não gostam de homens? Porque são feias, e nós somos lindas”, já disse numa pregação.
Em sua primeira experiência no funcionalismo púbico, Sara ficará alocada na secretaria sob tutela de Tia Eron (PRB-BA), ex-deputada da bancada evangélica que chegou a Brasília com apoio da Igreja Universal e ficou conhecida por ter dado o voto de Minerva que fez avançar no Conselho de Ética o pedido de cassação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ).
Mal seu nome começou a circular como possibilidade para o cargo, a ex-feminista virou alvo de críticas. Diziam que seu currículo não estava à altura do papel e que ela, inclusive, tentou turbiná-lo com uma fake news: ela já se apresentou como graduada em Relações Internacionais, mas tem o ensino superior incompleto, como consta na ficha do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de quando ela era candidata.
À reportagem Sara diz que o curso, que ela faz na modalidade ensino à distância, será completado em meados deste ano. “Mas, mais do que experiência acadêmica, tem a experiência de vida. Fui uma mulher que sofreu aborto, sei o que é isso. E tenho um filho, tive que parir.” Ela é mão de Héctor, 3, e atribui ao referido aborto seu racha com o movimento feminista.
Tinha 19 anos quando apareceu de peito de fora e beijando outra menina em capas de jornal Brasil afora, na posição de líder da célula nacional do Femen -grupo ucraniano adepto do “sextremismo” (em oposição ao machismo) e famoso pelo uso de nudez em protestos. Diz ter se decepcionado com as colegas da causa progressista quando, grávida e desamparada pelo pai da criança na barriga, viu-se induzida a abortar. Arrependeu-se e virou autora de livros digitais como “Vadia, Não! Sete Vezes que Fui Traída pelo Feminismo”.
Foi aos 14 anos que Sara Fernanda Giromini virou Sara Winter. “Na época meus pais não me deixavam usar meu nome de verdade no Orkut [antiga rede social]”, lembra. Ela conta que se identificava com as músicas da cantora Emilie Autumn, com um repertório de viés feminista que faria a Sara de 2019 corar, como “Gothic Lolita” (Lolita gótica). Autumn significa outono, e Winter, inverno.
Mais ensolarada, para Sara, foi a temporada que passou hospedada na casa da pastora Damares, justo “quando eu estava mudando de lado”. “Pedia a ela que me desse ordens, que me orientasse”, afirma sobre a hoje ministra e à época assessora do então senador e também pastor Magno Malta (PR-ES).
Sara conta que fez uma espécie de estágio informal no gabinete de Magno, auxiliando Damares. Um de seus afazeres como coordenadora na Esplanada, segundo Sara, será elaborar o Manual da Gestante, com orientações para as brasileiras grávidas. “Nessa minha trajetória, acredito ter salvo mais ou menos uns 700 bebês do aborto.”
Em seu site, além de oferecer palestras, ela promove uma vaquinha para angariar R$ 5.000 por mês sob o mote “salve bebês do aborto”.
“Parece muito, mas eu conseguiria pagar todas as minhas contas mensais e, aos pouquinhos, quitar minhas dívidas do cartão de crédito”, diz o texto.
“Além do mais, um dos meus sonhos é poder tirar carteira de motorista, assim eu poderia atender muito melhor as gestantes, poder levá-las para fazer exames na maternidade, entre outras coisas que necessitamos.”