SABATINA MAIS GOIÁS | FÁBIO JÚNIOR

Fábio Júnior: “Diferente do que empresários dizem, transporte público gera lucro”

Candidato a prefeito em Goiânia, Fábio Júnior (UP) é entrevistado da tarde desta quarta-feira (28)…

Candidato a prefeito em Goiânia, Fábio Júnior (UP) é entrevistado da tarde desta quarta-feira (28) do Mais Goiás. Um dos idealizadores da Unidade Popular, partido do qual é presidente estadual, ele é estudante de Ciências Econômicas na UFG e motorista de aplicativo.

A entrevista é uma sequência às sabatinas realizadas pelo Mais Goiás e BandNews FM, que ouviu os seis mais bem colocados postulantes ao paço municipal de acordo com a primeira rodada da Pesquisa Ibope. Nesta semana, o portal conclui as entrevistas com os demais candidatos presentes na disputa.

Entrevista

Mais Goiás – Primeiramente, queria saber: por que criar mais um partido político? A UP não se identifica com nenhum partido de esquerda?

Fábio Júnior – Na nossa interpretação, a maior parte da esquerda perdeu contato direto com a população. O PT, até o início dos anos 2000, tinha, mas quando entrou no governo houve o afastamento. Vemos, inclusive, que hoje a influência das esquerdas é pequena nas periferias. A esquerda parou no serviço público, sindicalismo, mas não chegou nos autônomos.

Mais Goiás – Isso me leva a outra questão: por que a esquerda não buscou mais uma unidade neste pleito? A UP tentou?

Fábio Júnior – Tiveram algumas conversas paralelas. Conversamos com o professor Pantaleão (hoje apoiando), que defendia a união em torno de um nome. Mas tudo que ouvimos é que os partidos não tinham disposição. Nenhum partido nos procurou, ouvimos que eles queriam lançar seus nomes e nós optamos por lançar o nosso. Se houvesse frente ampla, participaríamos. Então, preferimos lançar um nome do que fazer chapa dividindo campo. Achamos que nossa chapa pura poderia representar mais.

Mais Goiás – Em relação as pesquisas, você apareceu na primeira Serpes com 2% na estimulada, empatado com Virmondes, deputado estadual e nome conhecido. Na segunda, 0,3%. O que aconteceu?

Fábio Júnior – Acredito que nossos votos são divididos. Então, dependendo dos bairros onde foram contempladas as pesquisas, pode ter diminuído. Mas também atribuo a questão financeira. A segunda já foi realizada quando os demais partidos estavam gastando muito e nós tínhamos poucos recursos. Só hoje chegou nosso See Thru. Nossa campanha é mais nas feiras e terminais.

Quando os grandes partidos vão colocando dinheiro, vai ficando mais desigual. Mas ainda acreditamos que podemos ter um número positivo.

Mais Goiás – No seu plano, você diz que o eixo central da campanha é a reforma urbana e luta por moradia digna. Como colocar isso em prática, em especial, neste momento? Além disso, o que quer dizer com “não haverá (…) propriedade privada do solo urbano, que passará a ser coletiva”?

Fábio Júnior – Hoje, existe a previsão na constituição que a propriedade privada tem que cumprir função social. Se não cumpre, a prefeitura pode se apropriar para uso público ou por via judicial.

Na região central tem 500 imóveis vazios. Nossa prioridade seria dar função social a esse. Entendemos que a prefeitura não tem recursos abundantes, mas tem recursos. E nosso projeto é mudar a forma de arrecadação do IPTU, com uma maior progressividade. Temos dificuldade, pois o setor imobiliário faz lobby para não haver esse tipo de reforma. Mas é urgente que aqueles com grandes propriedades passem a pagar mais. Não seria tão oneroso, mas para a prefeitura faria muita diferença.

Para além disso, a prefeitura pode arrecadar mais, reconhecendo propriedades privadas não regularizadas. No Nova Esperança, por exemplo, a quantidade paga de IPTU é muito pequena. Isso pode aumentar bastante a arrecadação [com a regularização]. Goiânia foi construída com ocupações, então, há várias irregularidades. E isso também é bom para pessoa, pois garante a aquisição de crédito, mais segurança financeira, jurídica, etc.

Esses recursos também são fundamentais para melhorar os serviços públicos. A prefeitura pode ajudar a população a resistir a esse período de crise.

Mais Goiás – Na saúde, você propõe: “Introduzir um maior número de dentistas, técnicos e auxiliares nas UBS, aumentando os programas odontológicos.” Hoje falta o básico. Como implementar, então, essa questão? E o custo disso? Será feito por concurso ou contrato? É viável?

Fábio Júnior – Também acreditamos que hoje falta o básico em cais e postos de saúde. No Cais de Campinas, em vez de médicos, a gente encontrou Guardas Civis, recentemente. Na ausência da possibilidade de prestar o serviço, mandaram a guarda para evitar protestos.

Durante esse período de pandemia muitos médicos pediram demissão para trabalhar em Aparecida, onde há condições melhores de trabalhos e insumos… Nosso projeto de reforma urbana inclui a tentativa de expansão do sistema de saúde com mais insumos e médicos, aproveitando a estrutura, e também novas unidades para retirar a sobrecarga dos bairros. Expansão interna e geográfica.

Então, queremos que o sistema também cubra a área odontológica, que está mais destinado ao serviço privado. Inclusive, a notícia do decreto do Bolsonaro para privatizar o SUS nos preocupa muito, pois com a crise piorando e a desigualdade social aumentando não vemos outra solução que não passe pelo serviço público. Isso não funciona em tempos de crises, pois a população passa a sofrer as necessidades das mais variadas.

Mais Goiás – Mas de onde viria o recurso?

Fábio Júnior – Entraria na mesma lógica da reforma urbana. Não se consegue fazer tudo de uma vez. Pretendemos iniciar um processo de organização da cidade. Aos poucos ocupar as áreas no centro, gerando programas de habitação, algo que não é imediato – varia caso por caso –, e a questão da saúde também será algo em construção, que passa pelo interesse da população e da sociedade.

E esse sentimento existe, tanto por parte da prefeitura quanto de setores privados. A questão é conseguir construir isso. Se for um projeto sério, acredito que o setor privado apoiaria o governo para sair da crise, gerando emprego e renda. É possível.

O que os entes privados querem é menos incertezas e insegurança para usar o dinheiro em investimentos. E o estado pode gerar confiança, com um ambiente para o mercado caminhar e se recuperar.

Mais Goiás – Na educação: “Ampliação dos CMEIs, com o objetivo de cessar o deficit goianiense em que, de acordo com a SEPLAN, 102 bairros de Goiânia não possuem Cmei e apenas 17 bairros possuem mais de um, o que é insuficiente.” Quanto isso vai custar e onde esse dinheiro vai sair? Quanto tempo para realizar?

Fábio Júnior – Todo o nosso projeto passa pela mesma lógica. Sabemos que o investimento tem que ser alto. Não temos os valores específicos, mas acreditamos que o processo se dará aos poucos. Na ocupação São Marcos, os moradores foram despejados, sendo que há 17 anos o local era destinado para a construção de um CMEI. Não acredito que, em nenhum momento, não tenha havido dinheiro para construir.

Hoje, as obras são voltadas para o trânsito, com modernização de vias. Se melhorar o transporte público e reduzir os veículos, sobraria mais para investir em CMEIs e outras obras de infraestrutura.

A expansão em CMEIs é fundamental, inclusive, para incremento na economia, pois libera as mães para trabalhar.

Mais Goiás – Você também fala em contratação de Psicólogos Escolares e Assistentes Sociais. Já há uma previsão de custos disso?

Fábio Júnior – Temos um planejamento. Hoje, passaria pela redução dos cargos comissionados para 30%, pois entendemos que são mais ligados a interesses políticos que uma prestação eficiente de serviço. Defendemos, então, a realização dos concursos públicos. Os concursos existem, mas têm chamado de maneira lenta. Essa questão de psicólogos e assistentes é recomendado, mas não implementado.

Então, a prefeitura vai buscar recursos para ir contratando aos poucos. A redução de comissionados geraria parte, mas as questões que já citamos, como a questão do IPTU progressivo, além de planejamento contribuiria para implementação dessa proposta para atingir as regiões mais periféricas.

O nosso plano não é fechado. Foi construído por estudantes, professores e técnicos. Então, pode não haver previsão precisa, mas tem maneiras de arrecadar por meio da criação de fundos, IPTU progressivo e outras formas alternativas, uma vez que entendemos a situação de contingenciamento do País.

Mais Goiás – Um dos pontos de destaque de seu plano é a questão de transporte e infraestrutura. Você propõe: “Redução imediata da tarifa do transporte público como ação inicial para um plano de gratuidade da passagem.” Vai reduzir para quanto? Como pretende fazer isso? E sobre a gratuidade, como bancar isso? A prefeitura tem condição de fazer os investimentos na saúde, educação, habitação e ainda bancar essa proposta?

Fábio Júnior – Nossa proposta de transporte também cobre o alternativo e o por aplicativo. Ao contrário do que os empresários alegam, o transporte público tem lucros. Se não fosse, eles não estariam se enriquecendo. Conhecemos a situação financeira desse empresariado. O contrato de consórcio em Goiânia permite situação de monopólio. Hoje só sabemos o que eles dizem ter arrecadado, mas não existe uma planilha de prestação de contas.

Nessa margem, as empresas se aproveitam para praticar monopólio, com valores mais altos. E nessa margem, dá para reduzir a tarifa de passagem e fazer política pública. Por isso defendemos a municipalização do transporte e, com isso, garantir a gratuidade para alguns setores, como desempregados – uma política de subsídio para essa pessoa pode ser fundamental para ajudar essa pessoa a retornar ao mercado de trabalho.

Mais Goiás – Você também fala em garantir a participação da sociedade nos debates referentes ao transporte por meio de Conferências Municipais do Transporte. A população sempre vai pedir os melhores ônibus e mais baratos, o que pode ser inviável. Nessa hora, vai se manter a vontade popular?

Fábio Júnior – Não acho que a tendência seja essa. Com o maior esclarecimento da população, a gente conseguiria construir alguns consensos para construir melhor as políticas públicas.

Em relação aos transportes, a participação popular é praticamente inexistente, hoje. Empresários e políticos são aliados, então financiam campanhas e os políticos mantém os contratos para que essa situação se perpetue.

A mobilidade urbana piorou bastante no período de pandemia. Era para haver redução no tráfico urbano perceptível, mas não conseguimos acompanhar, pois parcela grande da população opta por Uber, porque é precária a situação do transporte público.

Muitos deixaram de usar ônibus por ser risco à saúde nesse período de pandemia da Covid, pois continuam lotados. O transporte por app aumentou muito e, quando a economia voltar ao normal, teremos uma cidade sobrecarregada de carros. O caos urbano estará instalado.

Então, se não tentarmos um papel mais firme com relação ao transporte público, poderemos esperar engarrafamentos pesados.

Mais Goiás – Na previdência social, você quer propor redução do tempo de serviço mínimo para 25 anos. Qual o impacto financeiro de uma folha de aposentados crescente?

Fábio Júnior – Esta é uma proposta que pretendemos desenvolver. Nosso partido defende redução da carga horária de trabalho para seis horas, mas também retomada de empregos. Já me perguntaram se isso não seria contraditório. Porém, entendemos que a sociedade passa por um processo de mudança muito rápido. País tem perdido vagas de trabalho, que fazem parte da estrutura da economia, pois diversos setores têm se automatizando.

Não achamos que a saída para isso é precarizar e tirar direitos trabalhistas. Estado tem que gerar empregos. A gente acha que garantias e direitos devem ser mantidos e expandidos. Se continuarmos nesse processo de tirar direito e jogar as pessoas no mercado, impedindo-as de se aposentarem, teremos um colapso de emprego. A economia não absorve mais.

Essa redução do tempo de aposentadoria e de horário pode contribuir no sentido de manter direitos sociais. O problema de arrecadação maior está na União, mas tentamos resolver a parte do município. Então, com essa redução de carga horária, mais pessoas trabalham, e com direitos de aposentaria mais cedo, mais pessoas investem na economia.

Mais Goiás – Você diz ainda: “Impossibilitar, através de vetos, reformas na previdência municipal que prejudiquem o servidor.” Isso é interessante na teoria, mas, na prática, a Câmara poderia derrubar o veto. Além disso, a UP tem três candidatos a vereador. Você acha que formaria maioria na Casa de Leis, que tem poucos partidos de esquerda?

Fábio Júnior – Acreditamos que o legislativo flutua conforme a música que é tocada. Nesse período Bolsonaro, houve um fluxo para o lado dele. A partir de uma participação dos setores populares na política, conseguiríamos ter mais alcance, mesmo com menos representação. Com a opinião pública, os vereadores se sentem motivados a apoiar públicas.

Mais Goiás – Você aborda diversas minorias no plano. Entre elas, as pessoas com deficiência. O governo federal falou, recentemente, em locais exclusivos para PCDs. Divisão. O que acha disso? Caso uma medida provisória ou lei seja imposta nesse sentido, o que pode ser feito como prefeito?

Fábio Júnior – Essa análise de espaços específicos depende do teor. Se estivermos falando de ensino técnico ou profissionalizante é importante. Mas se falamos de ensino comum pode gerar maior quantidade de preconceito e interpretações equivocadas de não eficientes.

É uma questão muito delicada. Pode até piorar. Se a União estabelece isso via decreto ou no Congresso, a única coisa que a prefeitura pode fazer é recorrer por via judicial.