Governo discute volta do fundão eleitoral de R$ 5,7 bilhões em 2022
Congresso aprovou R$ 4,9 bi no Orçamento, mas Executivo avalia valor maior baseado em diretrizes orçamentárias
O governo Jair Bolsonaro (PL) avalia elevar novamente o valor do fundo eleitoral para este ano e resgatar o montante que havia sido estabelecido inicialmente pelo Congresso, de R$ 5,7 bilhões —quase o triplo dos recursos de 2020. Hoje, o Orçamento de 2022 aprovado por deputados e senadores prevê um valor menor, de R$ 4,9 bilhões.
O fundão eleitoral é a principal verba pública das campanhas e foi inflado no Congresso com o apoio de uma ampla gama de partidos — o centrão, que hoje abriga Bolsonaro, a esquerda, que apoia a candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), além de outras siglas fora da órbita desses dois pré-candidatos.
Auxiliares do presidente entendem que o governo precisa ampliar o valor por ele ter sido previsto em regra da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias). Do contrário, a interpretação é que Bolsonaro correria risco de descumprir a lei.
Técnicos do Ministério da Economia trabalham com a possibilidade de remanejar cerca de R$ 800 milhões, hoje alocados em outras despesas, para elevar o valor do fundo até o máximo permitido em lei. A própria equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) reconhece que analisa se o valor chegará aos R$ 5,7 bilhões ou ficará nos R$ 4,9 bilhões estabelecidos quando a lei orçamentária foi aprovada, dias antes do Natal.
“O Ministério da Economia (Secretaria Especial do Tesouro e Orçamento) está analisando a compatibilidade entre a LOA [Lei Orçamentária Anual] e a LDO para definir o valor”, afirmou a pasta.
A elaboração do Orçamento da União é feita em duas etapas e envolve governo e Congresso. A primeira é a LDO, que é enviada pelo Executivo ao Congresso no primeiro semestre de cada ano e estabelece as diretrizes para a elaboração do Orçamento do ano seguinte. A segunda etapa é a LOA, enviada no final de agosto de cada ano e que define o Orçamento em si.
A análise em curso pela equipe de Guedes tem como pano de fundo um impasse sobre a interpretação da LDO de 2022. Em julho do ano passado, o Congresso incluiu na lei uma regra para estipular o valor do fundo eleitoral —uma fatia das emendas de bancada que seja equivalente a 25% do orçamento da Justiça Eleitoral em 2021 e 2022. A conta resultou no valor de R$ 5,7 bilhões, maior patamar desde que o fundo foi instituído em 2017.
O chamado fundão eleitoral foi criado após o STF (Supremo Tribunal Federal) proibir, em 2015, o financiamento privado de campanhas, na esteira dos escândalos da Operação Lava Jato.
Com isso, o Brasil acabou se tornando o país que mais destina recursos públicos para campanhas eleitorais no mundo, na comparação com 25 das principais nações do planeta. A verba é distribuída aos partidos, em linhas gerais, de acordo com o tamanho das bancadas na Câmara e no Senado.
Pressionado por sua base mais ideológica, Bolsonaro vetou o dispositivo da LDO. Em dezembro, porém, congressistas de diversos partidos da esquerda à direita se uniram para derrubar o veto presidencial, o que restabeleceu a regra que estipula o valor de R$ 5,7 bilhões.
Legendas do centrão também apoiaram a derrubada do veto, como o PP de Ciro Nogueira (ministro da Casa Civil), e o PL de Valdemar Costa Neto, ao qual Bolsonaro se filiou no fim de novembro. O problema é que na votação da proposta orçamentária, que é a etapa seguinte na elaboração das despesas e receitas do ano seguinte, foi aprovada uma dotação menor, de R$ 4,9 bilhões.
A diferença abriu um impasse dentro do governo. Na avaliação de técnicos, a Economia é obrigada a pedir a reposição dos valores até a cifra estipulada na LDO. No entanto, a visão de que o valor máximo se trata de uma imposição ainda não é consenso. A questão tem gerado discussões internas no Executivo e no Legislativo.
Congressistas e especialistas levantam dúvidas se o Palácio do Planalto é obrigado a aumentar o valor, ou se a regra da LDO representa um teto, não um mínimo. Qualquer valor que seja fixado no Orçamento acabará beneficiando o próprio presidente Bolsonaro e partidos da base aliada.
A possibilidade de seguir o valor estipulado pela LDO, ampliando o que já está previsto na LOA, divide especialistas em Orçamento. Vista como uma questão técnica, também causou divergência entre congressistas na época da votação do Orçamento. Líderes do centrão, por exemplo, diziam acreditar que deveria valer o determinado pela lei de diretrizes, ou seja, R$ 5,7 bilhões.
Para Élida Pinto, professora da FGV-SP e procuradora do Ministério Público de Contas do Estado de São Paulo, as diretrizes funcionam como um teto, não como uma imposição rígida. Portanto, na avaliação dela, se o Executivo pagar o valor maior, será porque assim escolheu.
“A LDO não obrigou [o governo] a gastar R$ 5,7 bilhões. Apenas autorizou a expansão até esse montante, como uma espécie de sublimite máximo. A LOA o respeitou, mas alocou valor um pouco abaixo: R$ 800 milhões a menos”, disse.