Inquérito sobre lavagem e crime eleitoral de Flávio Bolsonaro terá sequência na PF
Corporação pediu arquivamento, mas MP-RJ discordou e investigação continua ativa. Polícia Federal tenta esclarecer se o senador cometeu lavagem de dinheiro e falsidade ideológica na apresentação de bens à Justiça Eleitoral
O inquérito eleitoral que investiga se o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) cometeu lavagem de dinheiro e falsidade ideológica eleitoral ao declarar seus bens para a Justiça Eleitoral não será arquivado, como pretendia a Polícia Federal (PF) na conclusão do inquérito, em março. O promotor Alexandre Themístocles, titular do Ministério Público do Rio (MP-RJ) junto à 204ª Zona Eleitoral (Santo Cristo), onde o caso tramita, discordou do relatório da PF e vai dar sequência à investigação. Este é o único caso que se sabia até agora em que um dos filhos do presidente Jair Bolsonaro tenha sido investigado pela Polícia Federal no Rio — a superintendência fluminense é pivô do inquérito que apura eventual interferência indevida de Bolsonaro na corporação.
Como próximo passo, Themístocles vai pedir auxílio ao Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção (Gaecc) na investigação. Os promotores do grupo já investigam o senador por peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa no caso da suspeita da prática de “rachadinha” na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) — a devolução de salário por parte dos funcionários do gabinete.
O foro do caso é da 204ª Zona Eleitoral, que está sob titularidade do juiz Flávio Itabaiana, o mesmo magistrado responsável pelo caso da “rachadinha” na 27ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio. Foi Itabaiana quem proferiu as decisões de primeiro grau das investigações do MP do Rio e autorizou em abril do ano passado a quebra de sigilo bancário e fiscal de Flávio e outras 95 pessoas e empresas. Em dezembro de 2019, ele também deferiu medidas cautelares que permitiram a busca e apreensão em endereços ligados a Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio, e a familiares de Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro, que foram funcionários do senador na época da Alerj.
O pedido de auxílio ao Gaecc está relacionado ao fato de que as duas investigações possuem objetos semelhantes — ambos os procedimentos tratam do patrimônio do senador. A parte que seguiu para o MP estadual apurar é sobre a suspeita de falsidade ideológica eleitoral devido às discrepâncias nas declarações de bens do senador em diferentes eleições nos últimos anos.
A investigação que estava na PF se iniciou em 2018, com uma notícia crime feita pelo advogado Eliezer Gomes da Silva que apontava o fato de Flávio ter declarado em 2014 e 2016 ser proprietário de um apartamento no bairro de Laranjeiras, mas ter atribuído valores diferentes para o mesmo apartamento em cada ano. Ao disputar a reeleição na Alerj, em 2014, Flávio declarou o imóvel com valor de R$ 565 mil, mas quando disputou a prefeitura carioca em 2016 ele declarou R$ 423 mil — metade do patrimônio, que no total teria R$ 846 mil.
O delegado Erick Blatt, da PF do Rio, era o responsável pela investigação, que correu durante a gestão do ex-diretor-geral da PF Maurício Valeixo. No relatório do inquérito, em março, o delegado informou não ter encontrado indícios dos crimes. O GLOBO apurou que a PF concluiu o caso sem fazer quebras de sigilo fiscal e bancário.
A defesa de Flávio
As negociações imobiliárias de Flávio são investigadas pelo MP do Rio desde julho de 2018, a partir do relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que apontou uma movimentação atípica de R$ 1,2 milhão na conta de Fabrício Queiroz e repasses de assessores do gabinete de Flávio para ele. Ao pedir medidas cautelares à Justiça, no curso das investigações no ano passado, os promotores do Gaecc apontaram ter indícios de que o dinheiro supostamente obtido com a devolução dos salários seria usado na compra de imóveis.
Segundo os promotores, há nas operações de compra e venda de imóveis “lucratividade excessiva”. O imóvel que era alvo da PF também faz parte do procedimento do MP do Rio. No mesmo período em que a venda do apartamento se concretizou, um relatório do Coaf sobre Flávio mostrou que o senador fez 48 depósitos de R$ 2 mil totalizando R$ 96 mil ao longo de cinco dias em junho de 2017.
Em fevereiro, o advogado Frederick Wassef, que defende o senador, afirmou que o pedido de arquivamento da investigação pela PF “reforça a inocência de Flávio Bolsonaro” e que os investigadores “entenderam que não há indício de crime ou qualquer irregularidade e que, portanto, a denúncia não tem fundamento”. Por fim, ele declarou que “tudo isso deixa ainda mais evidente que o parlamentar enfrenta uma campanha de perseguição movida por forças com interesses escusos” e que “a defesa acredita na Justiça brasileira e tem certeza que a verdade prevalecerá”.