O posicionamento de Lula sobre o PL do Aborto
Presidente da República se posicionou pela primeira vez
Três dias após a Câmara dar urgência a um projeto que equipara o aborto após a 22ª semana de gestação ao crime de homicídio, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se posicionou pela primeira vez contra a medida e chamou o projeto de “insanidade”. A declaração do petista ocorre após a repercussão negativa da iniciativa, que foi aprovada sem oposição do PT, partido do presidente, e outras legendas da base aliada. A decisão dos deputados, contudo, motivou protestos pelas ruas do país.
Ao ser questionado sobre o assunto na quinta-feira, quando desembarcou em Genebra, na Suíça, Lula evitou comentar a proposta e disse que se informaria sobre o tema apenas quando voltasse ao Brasil. Os protestos, porém, fizeram com que a primeira-dama, Rosângela Silva, a Janja, e outros ministros do governo abondanassem o silêncio sobre a medida, defendida pela bancada evangélica do Congresso, e passassem a criticar publicamente a iniciativa.
Lula sobre o PL do Aborto: “insanidade”
Ao se manifestar sobre o tema neste sábado, Lula disse ser contra o aborto, mas afirmou que a prática é uma realidade no Brasil e deve ser tratada como questão de saúde.
— Eu sou contra aborto, entretanto, como aborto é realidade, a gente precisa tratar aborto como questão de saúde pública. E eu acho que é insanidade alguém querer punir uma mulher numa pena maior que o criminoso que fez o estupro. É no mínimo uma insanidade isso — afirmou Lula.
O presidente ainda criticou o fato de, ao equiparar a pena de aborto ao de homicídio, uma vítima de estupro pode ser condenada a mais tempo de prisão que o seu estuprador.
— Sinceramente, à distância, não acompanhei o debate muito intenso no Brasil, quando voltar vou tomar ciência disso. Tenho certeza do que tem na lei já garante que a gente aja de forma civilizada para tratar com rigor o estuprador e para tratar com respeito a vítima. Quando alguém apresenta uma proposta que a vítima precisa ser punida com mais rigor que o estuprador, não é sério — disse Lula.
Câmara aprovou urgência na votação
A urgência do texto foi aprovada a toque de caixa quarta-feira na Câmara — e gerou mobilizações nas redes sociais contra sua aprovação e também protestos nas ruas de capitais brasileiras. Antes da votação, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), afirmou que a questão “não é matéria de interesse do governo”, como revelou a coluna de Malu Gaspar.
De acordo com lideranças dos partidos de esquerda no Congresso, o objetivo dessa orientação do governo era evitar ainda mais desgastes em uma das piores semanas da administração petista, que enfrentou a devolução, por parte do Congresso, de uma medida provisória acabando com a cumulatividade do PIS/Cofins.
Havia, também, um temor da reação do público evangélico, de quem Lula gostaria de se reaproximar. O próprio autor do projeto, deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), chegou a afirmar à Folha de S.Paulo que a votação seria “um bom teste para o Lula provar aos evangélicos se o que ele assinou na carta era verdade ou mentira”.
A fala do deputado remete ao documento assinado pelo então candidato do PT à Presidência da República nas eleições de 2022, onde ele afirmava ser contra o aborto e rechaçava banheiros unissex em escolas, além de garantir que não fecharia templos.
A postura da liderança do governo facilitou a aprovação da urgência para o projeto em apenas 24 segundos, sem qualquer debate prévio. Na prática, só dois partidos de esquerda – o PSOL e o PCdoB – se opuseram publicamente ao projeto em falas contundentes durante a sessão. “A gente fica aqui se perguntando aqui se a filha de um de vocês fosse estuprada, o que vocês fariam?”, questionou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).
Depois que a urgência já tinha sido aprovada com o aval do PT, o líder da bancada do partido, Odair Cunha (PT-MG), se manifestou para “registrar a posição contrária do PT”.
Reação aos protestos
Na sexta-feira, depois de ver as reações ao PL do aborto crescer, o governo federal passou a se posicionar de maneira mais firme contra o texto, que teve a tramitação em regime de urgência aprovada nesta semana na Câmara. Os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Marina Silva (Meio Ambiente), Cida Gonçalves (Mulheres) e a primeira-dama Janja da Silva criticaram a proposta ontem.
Em suas redes sociais, a primeira-dama Janja da Silva afirmou que o PL é “preocupante” e “ataca a dignidade das mulheres e meninas”. A primeira-dama ainda criticou a tramitação do texto na Câmara dos Deputados, afirmando que era “preocupante” a aprovação da urgência sem discussão nas comissões temáticas. Com a tramitação acelerada aprovada pelos deputados, o texto pode ser votado direto no plenário. E concluiu não se pode “revitimizar e criminalizar essas mulheres e meninas”, e que é preciso “protegê-las e acolhê-las”.
Texto: Agência O Globo