Presidente do DEM diz que grupo não vai com extremos em 2022
Pivô de crise que abalou candidatura de aliado de Maia, presidente da sigla afirma que eleição na Câmara será página virada em breve e nega haver acordo com Doria
Personagem central da crise que abalou a candidatura do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) à presidência da Câmara, o presidente do DEM, ACM Neto, diz que a eleição do Legislativo será página virada em breve e que isso não interfere nas articulações para a eleição nacional de 2022.
Criticado por ter abandonado Rodrigo Maia (DEM-RJ) no pleito, ele nega que seu partido tenha se movido por cargos e emendas.
Sobre a próxima eleição presidencial, Neto afirma que não tem compromisso com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), mas que não descarta nenhuma opção. Nem mesmo o presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
O que fez o DEM rachar na eleição da Câmara? Existem várias explicações. Todos os partidos tinham certa divisão interna. Vejo especulações de que foi um movimento de aproximação do governo, de negociação com o presidente da República ou que tenha a ver com 2022. Tudo isso é falso. Não somos oposição e não temos intenção de aderir à base do governo.
Integrantes do DEM dizem que Rodrigo Maia não teve competência para articular sua base. O sr. concorda com essa avaliação? Prefiro não fazer comentários públicos a respeito do deputado Rodrigo. Tenho enorme carinho por ele. É um amigo de 20 anos. Ele teve papel fundamental para o Brasil. Não é o resultado dessa eleição que pode mensurar a importância de Rodrigo.
O sr. ajudou na escolha de Baleia Rossi e depois não garantiu que o partido permanecesse no bloco. Aliados do emedebista dizem que o sr. perdeu a confiança nesse processo. Faltou empenho da sua parte? Dei diversas declarações indicando que a preferência do partido era favorável ao deputado Baleia e assim permaneci até a última hora. Desejava que a bancada tivesse maioria para aderir ao bloco do Baleia. Não sou dono do partido e não posso me sobrepor à vontade da maioria.
Maia reclamou do sr. em uma reunião fechada e disse que o DEM corria o risco de ser chamado de “partido da boquinha”. Como o sr. viu essa declaração? O deputado Rodrigo sabe que eu jamais admiti negociar qualquer tipo de cargo para integrar o governo. Não quero indicar nem um porteiro para o governo. Esse tipo de especulação se dissipa rapidamente com os fatos.
A eleição foi marcada por distribuição de cargos e emendas. O DEM rachou por isso? Não foi isso. Não foi nem cargo nem emenda. Vários fatores colaboraram para esse quadro. E o que explica o processo é a soma desses fatores.
Mas o sr. nega que o racha tenha sido por cargos e emendas, não opina sobre se Maia articulou mal. Então, quais são exatamente esses fatores que o sr. diz? Pode pegar um raio-x da bancada e vai ver que temos desde questões regionais, por exemplo. Tem parlamentar que não aceita compor bloco com a esquerda. Esse para mim não é um problema. Como presidente do partido, como prefeito de Salvador, nunca foi um problema dar as mãos para o PT para enfrentar a pandemia. Realmente não tem uma explicação só.
Para o sr. não seria interessante não compor o bloco por ter planos para a Bahia em 2022? Em nenhum momento eu coloquei a Bahia nesse processo. O que eu ganharia com isso? Não ganho nada. Isso não é verdade. Neste momento, as pessoas têm que procurar culpados e desculpas. Eu não suporto fazer política procurando culpados e desculpas. Quem fica procurando culpados e desculpas não enxerga os eventuais erros que cometeu ao longo do processo.
O DEM não termina o processo com a imagem vinculada a um governo que negou a pandemia? Não, porque não é real. Isso se desfaz rapidamente. Esse assunto de eleição do Congresso será página virada em pouco tempo.
O bloco de Baleia também representava um grupo de partidos que olhavam para 2022. Isso se quebrou? Se era, nunca falaram comigo. Não tratei de 2022 em nenhum momento. A discussão de 2022 vai ter sua hora certa para começar. Se isso frustra a expectativa de alguém é porque alguém criou expectativa equivocada.
Qual é a hora certa para falar de 2022? Acho que a partir do segundo semestre deste ano. O primeiro tem de estar voltado para a pandemia, a vacinação, medidas que possam retomar o crescimento econômico. Não é hora de falar de política.
Alguns integrantes do DEM dizem que João Doria (PSDB) não deve ser a opção do partido. O sr. concorda? Não vou dizer isso de maneira alguma. Tenho um respeito muito grande pelo governador João Doria. Acho que ele será um dos atores. Da mesma forma que lhe afirmo que não temos compromisso com Doria, e nunca tivemos, também devo dizer que jamais nós descartamos essa possibilidade. Não é certo dizer que há compromisso, como não é certo dizer que há veto.
Há também a avaliação de que o processo afastou Luciano Huck do partido. O sr. acha que ainda há chance? Não vejo isso. Nunca discutimos partidariamente o ingresso de Luciano. Tenho relação com ele muito próxima, é um grande quadro da vida pública. Mas quem tem visão crítica da política sabe que esse foi um processo apenas do Legislativo. Se essa conversa um dia tiver que acontecer, não acho que o processo tenha qualquer interferência.
O sr. disse que não descarta nenhuma opção para 2022. O sr. não descarta a opção de estar com Bolsonaro em 2022? Nós não estaremos com os extremos. Você pergunta se eu descarto inteiramente a possibilidade de estar com Bolsonaro. Neste momento não posso fazer isso. Qual Bolsonaro vai ser? Os dos dois últimos anos que passaram? Não queremos. Agora, haverá um reposicionamento? Para a construção de algo mais amplo, que não fique limitado à direita? Não sei. Então, não posso responder agora. Portanto, seja Doria, Bolsonaro, Huck, Ciro [Gomes], [Luiz Henrique] Mandetta, qualquer um dos nomes, vamos saber com o passar do tempo se vai ter mais ou menos chance.
E Sergio Moro? Vejo Moro mais distante da política. Moro faz questão de se posicionar muito distante. Então, considero uma opção bem menos provável.
O sr. considera estelionato eleitoral o fato de Bolsonaro apoiar o centrão agora, depois de ter criticado na campanha? Não vou dizer que foi estelionato eleitoral porque é forte demais. Mas houve um erro no passado de desconsiderar a necessidade de uma construção política sólida e há um erro no presente de conduzir essa negociação política com base em ocupação de espaço. Não é a linha do DEM. Discordamos disso e por isso não integramos o centrão.
Tem sido assim agora, então, com base em cargos, é isso? Veja, não preciso comentar isso. Os fatos estão aí. Mas quero dizer o seguinte: não sou daqueles que acham que não pode ter políticos ocupando cargos no Executivo. É possível conciliar gestão e política. Fiz isso durante oito anos em Salvador. O que eu sou contra é o toma lá da cá.
O que na prática faria o DEM integrar o governo? A gente quer que avancem as agendas de reforma. Temos um problema agora. Fora do campo econômico, é preciso equilíbrio e moderação. O DEM não é a favor do negacionismo. Se o governo estiver do lado do negacionismo, vai estar longe do partido. Se estiver na agenda da vacinação, vai se aproximar. Tudo vai depender da postura do governo.
O sr. considera que Bolsonaro é menos extremista do que há dois anos? Prefiro não responder essa pergunta. Não me cabe aqui ser comentarista do presidente da República. O que é fato é que o país vai julgar na hora certa o conjunto da obra. Acho que o presidente tem pessoas no entorno dele que são mais extremistas do que ele.
Por que o sr. tem esperança de que o governo vá diminuir o negacionismo? Como cidadão, não posso perder a esperança.
A eleição de Rodrigo Pacheco (DEM-MG) e Arthur Lira (PP-AL) reduz a chance de abertura de processo de impeachment? Não acho que exista clima no país para isso. Não acho que existam questões jurídicas para isso. Espero que a postura dos presidentes seja de construção de pontes. Não tem que se esperar agora que sejam líderes de oposição. Como não podem ser líderes do governo.
Rodrigo Maia fica no partido? É uma decisão que cabe exclusivamente a ele. Desejo que ele fique. Ele pode estar chateado comigo, com o partido, não entender a posição que fomos obrigados a tomar, mas espero de verdade que ele fique. Vou respeitar qualquer que seja a decisão dele.
O sr. falou com ele? Ele sabe disso: todas as vezes que ele cogitou deixar o partido, eu dizia que a casa dele e o caminho dele são no Democratas. Mas não posso decidir por ele. Caso decida ficar no partido, ele terá todo conforto e prestígio para isso.
Raio-X
Antônio Carlos Magalhães Neto, 42
Prefeito de Salvador entre 2013 e 2020, é presidente do DEM. Neto do ex-governador e ex-senador Antônio Carlos Magalhães, foi deputado federal por três mandatos (2003-2012)