‘PT não tem que fazer autocrítica’, diz Lula em evento do partido na Bahia
Em seu primeiro ato partidário desde que foi solto da carceragem da Polícia Federal na…
Em seu primeiro ato partidário desde que foi solto da carceragem da Polícia Federal na última sexta-feira (7), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirmou que o PT não precisa fazer nenhuma autocrítica e não nasceu para ser um partido coadjuvante.
As declarações foram dadas nesta sexta-feira (14) durante a reunião da Executiva Nacional do PT em um hotel no centro de Salvador. Em cerca de uma hora, de improviso, ele centrou o discurso na defesa do PT e afirmou que não se diminuir nem criticar a si mesmo.
“Vocês já viram alguém pedir para FHC fazer autocrítica? […] Quem quiser que o PT faça autocrítica, que faça a crítica você. Quem é oposição que critica, ela existe para isso […] Na dúvida, a gente defende o nosso companheiro”, afirmou o ex-presidente.
Após 580 dias preso na PF em Curitiba, Lula foi solto na semana passada, beneficiado por um novo entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal) segundo o qual a prisão de condenados somente deve ocorrer após o fim de todos os recursos. O petista, porém, segue enquadrado na Lei da Ficha Limpa, impedido de disputar eleições.
Nesta quinta, em Salvador, Lula afirmou que o partido não deve abrir mão de seu protagonismo e que deve lançar candidatos em todas as cidades possíveis na eleição municipal de 2020 para defender o seu legado. “Nosso partido tem que sair mais forte, mais disposto a brigar. Sabe quem polariza? Quem disputa o título. Um partido só cresce quando disputa”, afirmou o ex-presidente.
Ele lembrou que o partido polarizou todas as eleições nacionais brasileiras desde 1989 e disse que vai continuar polarizando em 2022. “O PT não nasceu para ser um partido de apoio”.
O ex-presidente voltou a criticar parcela do Judiciário, Ministério Público e Polícia Federal. Disse ser um profundo respeitador do Ministério Público, mas afirmou que quase todos os procuradores “pertencem a uma casta cujo único grande trabalho foi prestar um concurso”.
Afirmou que defende a Polícia Federal forte, mas que uma instituição forte não pode fazer politicagem. Ainda criticou o ex-juiz e ministro da Justiça Sergio Moro, a quem mais uma vez chamou de canalha.
Mesmo com as críticas, afirmou que não sente ódio e que não quer se vingar de ninguém. “Eles não vão conseguir me devolver 580 dias, mas não tem problema”, afirmou.
Buscando um discurso um pouco mais conciliador, afirmou que nenhum presidente fez uma gestão mais ampla do que ele, atendendo desde empresários a trabalhadores sem-teto.
Lula ainda fez críticas à gestão Bolsonaro, com poucas referências diretas ao presidente. Na principal delas, afirmou querer travar uma disputa política democrática com ele. “Bolsonaro que não pense que eu quero brigar com esses milicianos. Não quero. Essa briga resultou na [morte da] Marielle [Franco].”
Por fim, falou que vai lutar para recuperar os seus direitos políticos. Mas evitou cravar que deseja voltar a disputar à Presidência da República. E disse que quer subir a rampa do Planalto em 2022, mas não necessariamente como presidente.
“Posso subir a rampa em 2022 levando o companheiro [Fernando] Haddad, levando o companheiro Rui [Costa, governador da Bahia] ou outros companheiros do PT”, afirmou.
Lula permaneceu preso de 7 abril de 2018 a 8 de novembro de 2019 em uma cela especial da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba. O local tinha 15 metros quadrados, com banheiro, e ficava isolado no último andar do prédio. Ele não teve contato com outros presos, que ficavam na carceragem, no primeiro andar.
Lula foi condenado em primeira, segunda e terceira instâncias sob a acusação de aceitar a propriedade de um tríplex, em Guarujá, como propina paga pela empreiteira OAS em troca de três contratos com a Petrobras, o que ele sempre negou.
A pena do ex-presidente foi definida pelo Superior Tribunal de Justiça em 8 anos, 10 meses e 20 dias, mas o caso ainda tem recursos pendentes nessa instância e, depois, pode ser remetido para o STF.
Nessa condenação, Lula já havia atingido em setembro a marca de um sexto de cumprimento da pena imposta pelo STJ. Por isso, mesmo antes da recente decisão do Supremo, ele já reunia condições para deixar o regime fechado de prisão.
Nas próxima semanas, porém, o Supremo pode anular todo esse processo do tríplex, sob o argumento de que o juiz responsável pela condenação, o hoje ministro Sergio Moro, não tinha a imparcialidade necessária para julgar o petista. Não há data marcada para que esse pedido da defesa do ex-presidente seja analisado.
Além do caso tríplex, Lula foi condenado em primeira instância a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem no caso do sítio de Atibaia (SP). O ex-presidente ainda é réu em outros processos na Justiça Federal em São Paulo, Curitiba e Brasília. Com exceção de um dos casos, relativo à Odebrecht no Paraná, as demais ações não têm perspectiva de serem sentenciadas em breve.
Do lado de fora do hotel, um grupo de cerca de 200 militantes foi ao local saudar o ex-presidente e fez discursos em um carro de som. O ex-presidente não saiu para cumprimentar os militantes, mas, no discurso, chegou a chorar ao agradecer a solidariedade dos aliados.
Aliados do ex-presidente comentaram sobre o papel que será cumprido pelo petista nos próximos anos e o tom que deve ser adotado pelo partido na oposição a Bolsonaro.
O senador Jaques Wagner (PT) disse considerar um equívoco fazer uma leitura sobre o tom político que será adotado pelo ex-presidente Lula com base nos primeiros discursos que ele fez após sair da cadeia.
“Você pedir que alguém que ficou 580 dias preso injustamente saia falando de flores, óbvio que não”, disse. Para Wagner, contudo, o ex-presidente deve adotar a posição que marcou os seus anos na Presidência da República [2003-2010].
“Sei que tem muita gente que torce por uma polarização. Mas o povo quer Lula aqui fora para resolver problemas e não para brigar com o rapaz lá [Bolsonaro]. Até porque os tamanhos são muito diferentes, ele não merece isso”, afirmou.
Presidenciável derrotado na eleição de 2018, Fernando Haddad (PT) afirmou que Lula irá ajudar o partido a reconstruir um projeto para o país, com propostas que façam contraponto à gestão do presidente Jair Bolsonaro.
“Não existe democracia sem oposição. Lula reforça a oposição. Mas não é uma oposição ao país, mas ao projeto que o Bolsonaro representa, um projeto intolerante, que joga na violência e está criando antagonismos”, disse.
Lula desembarcou em Salvador na noite desta quarta-feira (13), quando participou de um jantar no Palácio de Ondina, residência oficial do governador da Bahia Rui Costa (Bahia).
Além do anfitrião, participara do jantar os governadores petistas Fátima Bezerra (Rio Grande do Norte) e Wellington Dias (Piauí), o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, o senador Jaques Wagner (PT-BA) e a presidente do PT Glesi Hoffmann.
O ex-presidente fica na Bahia até o próximo sábado (16) e vai descansar em uma praia no litoral norte do estado com a namorada Rosângela da Silva. No domingo (17), participa do Festival Lula Livre, no Recife.