Publicidade do 7/9 paga por Bolsonaro no Facebook supera a de ministérios
Gasto supera o de páginas dos Ministérios da Saúde, Educação e Cidadania desde agosto de 2020
Em meio ao período eleitoral, o governo Jair Bolsonaro (PL) gastou aproximadamente R$ 230 mil para o impulsionamento de dez anúncios no Facebook e no Instagram sobre as comemorações do 7 de Setembro.
A despesa ampliou o alcance do conteúdo publicado no perfil da Secom (Secretaria Especial de Comunicação Social) para um público maior de 18 anos, apto a votar, segundo informações da Biblioteca de Anúncios da Meta (dona de ambas as plataformas).
O valor supera o que foi gasto para turbinar conteúdos das páginas, somados, de ministérios como os da Saúde, da Educação, da Cidadania, da Infraestrutura e do Desenvolvimento Regional de agosto de 2020 —a Meta, dona de Facebook e Instagram, disponibiliza informações sobre conteúdos patrocinados a partir dessa data— até a última terça (20).
Algumas dessas páginas estão atualmente inativadas, devido às restrições do período eleitoral. Ainda assim, as informações a respeito do impulsionamento de conteúdo delas continuam sendo divulgadas pela Meta.
As propagandas a respeito do bicentenário da Independência tiveram a divulgação autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), mesmo durante o período de campanha eleitoral, assim como outras que tratam de temas como saúde e educação.
Em comparação, no período eleitoral, não houve nenhum impulsionamento na página de Facebook do Ministério da Saúde —o último é de 2021, no valor de R$ 1.000.
O impulsionamento funciona como uma publicidade dentro das redes sociais controladas pelo grupo e faz com que o conteúdo produzido por quem está pagando apareça na página do usuário que faz parte do público-alvo.
Houve impulsionamentos nos mesmos meses, porém, em outros perfis na rede social de órgão vinculados ao governo.
Para divulgar o Censo 2022, o IBGE turbinou o alcance do seu conteúdo ao custo de R$ 400 mil nos últimos meses. Também houve gastos inferiores nas páginas dos ministérios do Meio Ambiente e da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.
Antes, o grosso dos impulsionamentos da gestão Bolsonaro era feito em conteúdos da página Governo do Brasil, que foi inativada no fim de junho, devido à campanha eleitoral.
Entre agosto de 2020 e junho de 2021, foram pagos mais de R$ 1 milhão para turbinar os posts do perfil.
A página temporária da Secom substituiu a do Governo do Brasil a partir de julho.
O único gasto até o momento foram os quase R$ 230 mil pagos para impulsionar entre os dias 7 e 10 de setembro peças publicitárias com textos e imagens idênticos, que exibiam cenas de diversas pessoas estudando ou trabalhando.
Na publicidade, um locutor afirma frases como “somos uma nação independente, que está escrevendo um futuro melhor” e, no fim, diz o slogan “200 anos de Independência do Brasil, o futuro escrito em verde e amarelo”. Elas foram vistas, segundo a Meta, por mais de 1 milhão de pessoas.
Ao optar pelo público que receberia essas peças publicitárias impulsionadas, a Secom definiu que gostaria que fossem apenas pessoas com mais de 18 anos. A rede social permite que sejam ampliadas publicidades para um público a partir dos 13 anos.
A Secom e o Ministério das Comunicações foram procurados diversas vezes pela reportagem, mas não se manifestaram.
As peças publicitárias sobre o bicentenário da Independência foram inicialmente vetadas por Moraes, no dia 25 de agosto, sob o argumento de que havia “viés político” no texto.
Moraes, porém, alegou “erro material” e mudou de decisão, liberando a propaganda no dia seguinte ao veto inicial. Ele vetou apenas o trecho da campanha dizendo “e essa luta também levamos para o nosso cotidiano, para a proteção das nossas famílias e sobretudo, para a construção de um Brasil melhor a cada dia”.
A frase barrada apresenta “eventual conotação eleitoral”, segundo Moraes.
O impulsionamento aconteceu ao mesmo tempo em que o presidente participava das festividades, nas quais ele subiu em palanque e adotou um discurso eleitoral. O TSE proibiu Bolsonaro de usar as imagens dos atos em suas propagandas.
A Lei das Eleições impede a publicidade institucional de órgãos públicos nos três meses que antecedem as eleições. Por isso, o governo tem de pedir a liberação ao TSE das campanhas que se encaixam em exceções desta lei.
As peças impulsionadas no Facebook têm apenas a identificação do ministério do Turismo. Assim como Moraes determinou, não há alusão a sites contendo, mesmo de forma abreviada, alusão ao governo.
Ao TSE a Secretaria Especial de Comunicação Social do governo Bolsonaro também fez outras solicitações, que foram atendidas pelo TSE.
É o caso de um pedido para campanha de reforço da vacinação contra a Covid-19, a de amamentação e a sobre varíola dos macacos, vinculadas ao Ministério da Saúde, e sobre a importância do Censo 2022, com identificação do IBGE e do Ministério da Economia.
Integrantes da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político) consultados pela reportagem consideram que o impulsionamento de conteúdos do 7 de Setembro pelo governo pode gerar tanto ações eleitorais como de improbidade administrativa.
“Pelo menos em tese, esse impulsionamento pode configurar abuso de poder econômico, associado a abuso de poder político, já que é um agente público”, diz o advogado eleitoral Renato Ribeiro.
“Está se despendendo recursos públicos para a promoção de um evento que teve claríssimo cunho eleitoral. Tanto teve uso eleitoral que o próprio TSE já proibiu o presidente da República de fazer uso das imagens e dos vídeos dos discursos no 7 de Setembro.”
A advogada eleitoral Letícia Lacerda afirma que há “nítido caráter de desvio de finalidade institucional” no impulsionamento dos conteúdos, assim como houve nos atos do 7 de Setembro.
De acordo com a plataforma Siga, mantida pelo Senado que monitora os gastos do governo federal, a gestão Bolsonaro informou ter gasto R$ 335 mil com impulsionamento de conteúdo no Facebook no segundo semestre.
A maior parte dos recursos —R$ 260 mil— foram investidos pelo Ministério das Comunicações, onde hoje fica a Secom.