Reajuste para policiais prometido por Bolsonaro pode custar R$ 2,8 bi em ano eleitoral
Bolsonaro entrou em campo para garantir o reajuste a essas corporações
O reajuste prometido pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) a policiais deve custar cerca de R$ 2,8 bilhões no próximo ano, quando ele pretende concorrer à reeleição.
O gasto com o projeto de reestruturação das carreiras da Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) foi calculado pelo Ministério da Justiça. A despesa até 2024 é estimada em R$ 11 bilhões.
Bolsonaro entrou em campo para garantir o reajuste a essas corporações, que fazem parte da sua base de apoiadores, como mostrou o jornal Folha de S.Paulo em novembro.
A promessa chega em um momento em que as carreiras têm, reservadamente, se mostrado insatisfeitas com Bolsonaro. Segundo auxiliares palacianos, os policiais se queixam de que, apesar de estarem próximos ao presidente, não tiveram benefícios durante os três anos de governo, como os militares.
O último aumento para os policiais federais entrou em vigor em 1º de janeiro de 2019, mas havia sido aprovado ainda no governo Michel Temer (MDB).
O chefe do Executivo tratou deste assunto em reunião no Palácio do Planalto na tarde desta terça-feira (14) com o ministro da Justiça, Anderson Torres, os diretores-gerais da Polícia Federal, Paulo Maiurino, da Polícia Rodoviária Federal, Silvinei Marques, e do Departamento Penitenciário, Tânia Fogaça.
Segundo relatos do encontro, não houve acerto final, mas representantes das polícias já começaram as conversas com a Economia para ver o que é possível ser feito em termos de reestruturação salarial.
As equipes têm pressa, uma vez que a ideia é que se chegue ainda neste ano a um valor do impacto financeiro, para que seja possível incluir a previsão na proposta orçamentária de 2022, ainda em análise no Congresso Nacional. Os estudos sobre a reestruturação das carreiras, por sua vez, seriam concluídos no ano que vem.
A reportagem a apurou que o Ministério da Economia vai enviar ao relator do Orçamento de 2022, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), um ofício comunicando a intenção de conceder o reajuste, mas sem detalhar ainda as carreiras beneficiadas. O objetivo é reservar o espaço que será necessário para ampliar os salários.
Das três corporações, a proposta que está mais encaminhada é a do Depen, que já teria sido construída com o Ministério da Economia nos últimos meses. Mas a ideia é que todas as três reestruturações -e reajustes- sejam anunciados conjuntamente.
De acordo com relatos de quem acompanha as discussões, a ideia para os policiais federais é implementar um padrão de promoção escalonada de carreira, a cada cinco anos. O objetivo seria evitar a evasão na carreira.
Já a PRF teria a mais radical mudança na estrutura da carreira, segundo o plano do ministério de Torres, também com impacto salarial. No caso do Depen, a ideia de transformar o cargo de agente federal de execução penal em policial penal federal, vinculado ao ministério, mudando inteiramente a carreira.
Apesar de insatisfeitas com o congelamento de seus salários, as categorias policiais do governo federal estão entre os maiores salários da Esplanada.
Na PF, a remuneração de um agente vai de R$ 12.522,50 a R$ 18.651,79 mensais, segundo o Painel Estatístico de Pessoal do governo federal. Os delegados ganham de R$ 23.692,74 a R$ 30.936,91.
Na PRF, os vencimentos vão de R$ 9.899,88 a R$ 16.552,34 mensais. Agentes do Depen, por sua vez, têm remuneração entre R$ 5.572,23 e R$ 10.357,30, segundo os dados do painel.
Para conceder o reajuste, é necessário reservar verba para bancar o projeto de reestruturação dessas carreiras, que ainda precisa tramitar pela Câmara e pelo Senado.
Segundo técnicos do Congresso, será necessário fazer cortes de despesas em outras áreas para poder acomodar esse aumento salarial na previsão de gastos de 2022.
A promessa de Bolsonaro já enfrenta resistência entre parlamentares. A aliados, o relator da peça orçamentária de 2022, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), afirmou que tentará reduzir o impacto da medida para R$ 1,4 bilhão.
O plano do relator é prever que o reajuste tenha validade a partir de julho. O argumento dele, segundo deputados próximos a Leal, é que o Congresso precisa de tempo para votar o projeto de reestruturação das carreiras e, diante do aperto nas contas públicas, falta espaço para atender todo o pedido de R$ 2,8 bilhões.
A respeito de onde viriam os recursos, a equipe que formula a versão final do Orçamento tem dito que ainda analisa como será feito o corte caso o governo e o Congresso queiram conceder o reajuste
“Não é bom falar antes das coisas acontecerem. Mas temos reunião com a equipe econômica. Para discutir uma coisa que interessa a todos vocês”, disse o presidente nesta terça em evento no Palácio do Planalto sobre ações da PRF (Polícia Rodoviária Federal) nas estradas.
Na véspera, Torres levou os diretores das corporações para reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, para tratar do reajuste salarial.
Delegado, o ministro deve ser candidato a deputado federal pelo Distrito Federal, e garantir o benefício às carreiras é uma importante pauta para ele na disputa no ano que vem.
Nesta terça (14), o ministro da Justiça disse que os valores dos reajustes, impacto fiscal e outros detalhes seriam definidos junto com equipe econômica. “Tem de fazer a previsão orçamentária. Para no ano que vem apresentar uma medida provisória”, afirmou.
O pedido para que o reajuste seja concedido via MP, que tem vigência imediata, enfrenta a resistência de técnicos da Economia.
Na avaliação desses técnicos, um reajuste salarial não atende aos requisitos de relevância e urgência para que o presidente assine uma medida com força de lei. Apesar disso, outros reajustes a categorias de servidores já foram concedidos via MP, como para auditores fiscais da Receita Federal, no fim de 2016.
A área econômica também alerta que o reajuste precisará se adequar ao espaço que for definido no Orçamento para a medida. Assim, quanto mais cedo entrar em vigor a reestruturação salarial, menor seria o reajuste em termos porcentuais.
Leal tenta finalizar as contas para levar o projeto de Orçamento de 2022 à votação no Congresso até o fim desta semana. No entanto, já há pressão para que a proposta seja analisada apenas na próxima semana.
O relator tem sido pressionado por líderes partidários a garantir recursos para as emendas de relator, mecanismo criado no Orçamento de 2020 para elevar o volume de emendas parlamentares e que tem sido usado para privilegiar aliados do governo na liberação de recursos.
Emenda é a forma que um deputado ou senador tem para enviar dinheiro do Orçamento federal para obras e projetos em sua base eleitoral.
A PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios -que altera o cálculo do teto e adia o pagamento de dívidas judiciais contra as quais já não cabe recurso- deve liberar, ao todo, cerca de R$ 106 bilhões de despesas no próximo ano.
Mas esse valor já está comprometido com despesas obrigatórias atreladas ao aumento da inflação e com a promessa de Bolsonaro de elevar o Auxílio Brasil para, no mínimo, R$ 400 mensais.
A proposta de reajuste aos servidores já está em estudo no governo desde o meio do ano, aproximadamente. Essa possibilidade ganhou contornos reais quando o governo decidiu driblar o teto com a PEC.
Inicialmente, a ideia era conceder o aumento salarial a todo o funcionalismo, uma vez que estão com salários congelados desde o início da gestão Bolsonaro. Entretanto, mesmo com a folga orçamentária no ano que vem, o governo percebeu que não teria recursos suficientes para bancar um reajuste linear a todos os servidores.
Segundo relatos, interlocutores do presidente entenderam que conceder um reajuste muito abaixo da inflação, como de 1%, teria um impacto mais negativo do que positivo. Assim, entenderam que seria melhor contemplar carreiras menos numerosas.
O próprio presidente teria solicitado prioridade às carreiras policiais, como a Folha de S.Paulo mostrou em novembro.
Em Dubai, Bolsonaro anunciou que o governo estudava a possibilidade de reajuste. Na ocasião, disse que seria para todos os servidores. Contudo, o Planalto já trabalhava com a possibilidade de contemplar apenas as carreiras policiais, como solicitou o presidente.
Recentemente, ele voltou a defender o aumento salarial aos servidores em ano eleitoral. No último dia 8, em entrevista, o mandatário disse que a medida seria feita sem estourar o teto de gastos.
“Teria [que ser reajuste de] 3%, 4%, 5%, 2%… Que seja 1%. Essa é a ideia. Porque nós estamos completando aí no meu governo três anos sem reajuste. Agora, o reajuste não é para recompor toda a inflação, porque não temos espaço para isso”, disse Bolsonaro em entrevista à Gazeta do Povo.
Se confirmado, este seria mais um aceno do governo federal às carreiras policiais. O único concurso feito durante o governo federal foi para Polícia Federal e Rodoviária Federal, de 3.000 vagas. Realizado neste ano, ele foi anunciado em 2020, ainda sob a gestão do então ministro André Mendonça.
Em setembro, o Ministério da Justiça também lançou um programa de habitação especial para policiais. O Habite Seguro contou com R$ 100 milhões em 2021, contemplando policiais que recebem até R$ 7.000 mil por mês.