Relator diz que pacote anticrime não deveria ser usado pra soltar traficante
Lafayette Andrada avalia que André do Rap reunia todas as condições para continuar na cadeia, de acordo com a legislação
O deputado Lafayette Andrada (Republicanos-MG), relator do pacote anticrime na Câmara, considera um erro o uso do parágrafo único do artigo 316 do Código de Processo Penal para libertar o traficante André do Rap. O dispositivo, aprovado pelo Congresso no ano passado, determina que os fundamentos da prisão preventiva sejam reavaliados a cada três meses. Como não houve nova análise da necessidade da prisão pela Justiça ou Ministério Público, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello decidiu soltar o traficante.
À época da tramitação do conjunto de medidas no grupo de trabalho da Câmara, Lafayette foi responsável por reunir propostas que tratavam de medidas cautelares. Essa era uma delas, apresentada por ele e debatida por todos os integrantes, assim como avaliada por especialistas da área do Direito. Ao GLOBO, Lafayette diz que a alteração na legislação tem o objetivo de favorecer presos “esquecidos”, com prisão preventiva decretada, mas sem condenação criminal. Segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), em 2019, 758.676 estavam encarcerados. Desses, 253.963, ou 33,47% do total, eram presos provisórios, sem condenação.
— O artigo 316 apenas explicita que prisão preventiva não é condenação e por isso precisa ser reavaliada a cada 3 meses. Entre os fundamentos que justificam a manutenção da prisão preventiva está a periculosidade do agente. Esse episódio do André do Rap é um típico exemplo de necessidade de manter o criminoso preso. Em minha opinião foi um erro soltá-lo — diz o parlamentar.
Ele avalia que há um consenso na área do Direito Penal sobre a necessidade de corrigir as distorções do sistema penitenciário. E esse trecho seria uma das contribuições. Ele avalia que André do Rap reunia todas as condições para continuar na cadeia, de acordo com a legislação.
— Compete ao MP e ao próprio Judiciário (avaliar a periculosidade do preso). Aqueles casos emblemáticos, perigosos, o MP tem que ter o necessário zelo que a sociedade demanda.
Candidato a prefeito de São Paulo e integrante do grupo de trabalho que elaborou o texto aprovado no Congresso, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) defende que a mudança no CPP foi positiva e que, se houve erro no processo em questão, “foi a omissão do procurador que não agiu nos termos da lei”. Ele também critica decisões baseadas no “censo comum”.
— O que deu causa para a liberdade para o líder do tráfico não foi a decisão do ministro Marco Aurélio, mas a omissão por parte do procurador. Aqui que está a causa. Porque cumprir a lei é a obrigação do juiz — afirma.
Silva ressalta que o texto não é do grupo de trabalho ou do relator da proposta, Lafayette Andrada (Republicanos-MG), mas do Congresso como um todo, já que foi aprovado por ampla maioria em ambas as casas, sem alterações. Ele acrescenta que o Brasil tem um “grave problema” de execução penal que atinge, sobretudo, os mais pobres.
— No Brasil, nós temos um problema grave na execução penal que atinge sobretudo os mais pobres. No Brasil, quem tem dinheiro consegue fazer a lei ser cumprida — comenta.
Também integrante do grupo de trabalho na Câmara, o deputado capitão Augusto (PL-SP) diz que a mudança no CPP foi acrescentada como um “cavalo de Tróia” no pacote anticrime, apesar de ele e do então ministro da Justiça Sergio Moro serem contrários à alteração. Como líder da frente parlamentar da Segurança Pública, Augusto diz que vai pedir a derrubada do texto na Câmara.
Questionado sobre o caso julgado pelo Supremo, ele afirma que houve uma “sucessão de erros“, em todos os Poderes. Segundo ele, o Congresso deveria ter “amarrado” melhor o artigo, com exceções à regra nos casos envolvendo crimes hediondo, por exemplo, enquanto o Executivo poderia ter vetado o trecho. Ele também critica a atuação do procurador do caso que não pediu a manutenção da prisão.
O parlamentar afirma, todavia, que o maior culpado no caso é o ministro Marco Aurélio Mello, que fez uma leitura ao “pé da letra” da lei e não levou em consideração o contexto do caso. Por esse motivo, promete protocolar um pedido de impeachment contra o magistrado.
— O grande responsável disso tudo, dessa grande aberração chama-se Marco Aurélio de Mello.
Se fosse para ler ao pé da letra, nem precisava de juiz, colocava num computador que já ia automático — afirma.