Volta de coligações terá resistência no Senado e pode ir para a gaveta
Senadores e presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), defendem que sistema atual seja testado mais vezes
Aprovada às pressas pela Câmara dos Deputados, a PEC (proposta de emenda à Constituição) que retoma as coligações nas eleições para deputados e vereadores não deve tramitar com a mesma celeridade no Senado, deixando em xeque a possibilidade de vigorar no pleito de 2022.
Além de avaliarem ainda não haver apoio da maioria da Casa, senadores consideram que esse tema requer mais debates, podendo tornar inviável a aprovação e promulgação da PEC até outubro, para valer nas eleições do ano que vem.
O próprio presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), tem defendido a manutenção das regras aprovadas na reforma política de 2017, que acabou com as coligações. Ele também avalia que os senadores não aprovarão as mudanças feitas pela Câmara.
A retomada da possibilidade de coligações foi aprovada em primeiro turno, por 333 a 149, pelo plenário da Câmara na noite de quarta-feira (11), depois que Arthur Lira (PP-AL), presidente da Casa, surpreendeu líderes partidários ao pautá-la antes do programado.
Por se tratar de mudança na Constituição, era preciso haver ao menos 308 votos, de um total de 513 deputados.
A PEC ainda depende de uma votação da Casa em segundo turno, prevista para a semana que vem. Há acordo entre os partidos, incluindo os da oposição, para aprovação.
As coligações tendem a estimular a proliferação de legendas, além de ser um frequente mecanismo de distorção do desejo do eleitor.
Isso porque, no primeiro caso, somente por meio dessas alianças algumas siglas nanicas e pequenas conseguem eleger representantes para os Legislativos.
As cadeiras são distribuídas de acordo com a votação total dada aos partidos e aos candidatos dos partidos que compõem a coligação. Ou seja, quanto mais robusta for a coligação, maiores as chances de siglas menores conseguirem eleger candidatos.
No segundo caso, é comum haver coligação de partidos que defendem posições antagônicas. Com isso, não raro o eleitor vota em um candidato de esquerda, por exemplo, e ajudar a eleger um de direita. E vice-versa.
Assim como na Câmara, no Senado uma PEC precisa do voto de ao menos 60% dos integrantes da Casa —49 de 81.
Nos próximos dias, líderes partidários do Senado devem se reunir com as bancadas para definir como vão se posicionar em relação à proposta.
A bancada do PSD, a segunda maior da Casa, com 11 parlamentares, pretende debater a PEC na próxima segunda-feira (16). O presidente nacional da legenda, Gilberto Kassab, é contrário à volta das coligações.
Para o líder da sigla, Nelsinho Trad (PSD-MS), as eleições para cargos proporcionais sem coligações precisam ser testadas em outros pleitos. “Eu acho que esse é um tema muito delicado. Entendo que o sistema atual deve ser experimentado mais vezes, porque ele fortalece os partidos”, afirmou.
Outras bancadas que devem avaliar a PEC nos próximos dias são a do MDB, a maior da Casa, e a do PT.
Os petistas são contra a volta das coligações, mas, na Câmara, votaram a favor da medida por causa do acordo que fizeram para derrotar o distritão, modelo de eleição de deputados e vereadores em que a maioria dos votos dados nos candidatos é descartada.
Entre os principais senadores do MDB, o entendimento é o de que a proposta não tem força para seguir adiante.
“Ao invés de estarmos caminhando para frente no sentido de fortalecer as nossas instituições, de fortalecer a nossa democracia, de fortalecer os nossos partidos políticos, de diminuir o número de partidos que nós temos no Congresso Nacional [….] nós demos dez passos atrás com a volta das coligações proporcionais”, afirmou Marcelo Castro (MDB-PI).
Apesar de a medida ter sido aprovada em 2017, a primeira eleição sem coligações entre os partidos ocorreu em 2020. A união das legendas em chapas ainda vale para os cargos majoritários —prefeito, senador, governador e presidente da República.
A proibição dessas uniões foi elogiada por especialistas por dar mais racionalidade ao voto do eleitor e dificultar a existência de agremiações de aluguel, reduzindo, assim, a sopa de letras partidária do país, que tem hoje 33 legendas.
O fim das coligações e a cláusula de desempenho são os dois pilares das regras que buscam sufocar legendas de aluguel ou sem representatividade na sociedade.
A cláusula retira de partidos que obtenham votação irrisória nas urnas mecanismos essenciais à sua sobrevicência, como a verba do fundo partidário e estrutura de trabalho nos legislativos.
Em 2018, 14 partidos caíram nessa peneira ao não conseguirem superar as regras da cláusula, sendo a principal delas a obtenção de ao menos 1,5% dos votos válidos nacionais na disputa para a Câmara dos Deputados. Em 2022 esse índice irá subir para 2%. Em 2030, será de 3%.
Um efeito prático desse primeiro ano de cláusula foi a extinção de três siglas nanicas, PHS, PPL e PRP. Elas foram incorporadas por partidos maiores.
O fim das coligações não atingiu as campanhas de senadores, uma vez que eles são eleitos pelo sistema majoritário. Ou seja, ficam com a vaga aqueles que tiverem a maioria dos votos nos respectivos estados.
Por esses motivos, o líder do PSDB no Senado, Izalci Lucas (DF), afirma que a PEC interessa apenas aos deputados e não beneficia a representatividade no Parlamento.
“Vejo a volta das coligações como um retrocesso. É uma matéria ligada à questão partidária, que interessa muito aos deputados. Acho difícil interferirmos nisso. Não acredito que os senadores vão se empenhar tanto para aprová-la”, comentou.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) também criticou as mudanças aprovadas pela Câmara.
“Sou contra a mudança de voto para o distritão e a volta das coligações partidárias. Ambas as medidas enfraquecem os partidos políticos e diminuem a representatividade e a conexão entre os eleitores e os eleitos”, escreveu no Twitter.
O retorno das coligações conseguiu aval do plenário da Câmara após os deputados rejeitarem o distritião.
A medida foi fruto de um acordo entre os defensores do sistema, que não tinham os 308 votos necessários para mudar o sistema eleitoral, e a oposição, que afirmou entender a volta das coligações como um “mal menor”.
Além da volta das coligações, a Câmara aprovou nesta quinta-feira (12) outra medida que tende a fragilizar as regras que tentam reduzir o número de partidos. Trata-se da possibilidade de partidos se unirem em federações para driblar a cláusula de barreira.
Com isso, em vez de serem extintas, se fundirem ou serem incorporadas por siglas maiores, as legendas com baixíssima votação poderão continuar a existir, desde que atuem conjuntamente com outra por ao menos quatro anos. Já aprovada pelo Senado, a medida seguiu para a sanção ou veto do presidente Jair Bolsonaro.
PRÓXIMOS PASSOS DA PEC QUE TRAZ DE VOLTA AS COLIGAÇÕES
- Ainda precisa ser aprovada em segundo turno pela Câmara, o que deve ocorrer na semana que vem
- No Senado, a PEC começa a tramitar pela Comissão de Constituição e Justiça. Se aprovada, segue para votação em plenário (no Senado não há comissão especial)
- Para ser aprovada pelo Senado, é preciso o voto de ao menos 49 dos 81 senadores
- Se for aprovada sem modificação em relação ao texto da Câmara, a PEC é promulgada pelo próprio Congresso e passa a vigorar
- Para valer para as eleições de 2022, porém, as regras têm que entrar em vigor ao menos um ano antes, ou seja, no início de outubro de 2021
A VOLTA DAS COLIGAÇÕES
O que são
Desde 2020 os partidos estão proibidos de se coligar para a eleição de deputados e vereadores. A coligação para as eleições majoritárias permanece
Por que as coligações foram proibidas
Objetivo foi sufocar agremiações de aluguel e reduzir o número de partidos hoje no país (33)
Por que podem voltar
Partidos nanicos e médios tendem a obter vagas no Legislativo apenas em coligações com siglas maiores. Com isso, pressionam pela retomada do modelo
Por que teria que se optar entre coligações e distritão
O atual sistema distribui as cadeiras com base em todos os votos dados na legenda e aos candidatos dos partidos. Quanto maior e mais forte a coligação, mais chances há de partidos menores elegerem representantes. No distritão, são eleitos os mais votados, ou seja, coligações são inócuas.