TRAMITAÇÃO

Voto impresso tem a função de animar a militância bolsonarista, diz cientista político

Câmara dos Deputados começa analisar matéria nesta semana; voto seria conferido diretamente por eleitor

Bia Kicis (PSL) (Foto: Will Shutter/Câmara dos Deputados)

Pautado pela deputada federal Bia Kicis (foto) (PSL), projeto de lei que pretende obrigar a retomada do voto impresso no Brasil deve tramitar a partir desta segunda-feira (17) na Câmara dos Deputados. Promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) o tema é considerado crucial para a militância bolsonarista, sobretudo diante dos desgastes do governo na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, que apura suposta negligência da administração federal no combate à pandemia.

O deputado federal Major Vitor Hugo (PSL) avalia que o voto impresso pode conferir “confiança ao processo eleitoral”, já que é a base de toda a democracia e representação popular. Ele aponta que a articulação para pautar a matéria na Câmara foi feita principalmente pelos deputados do PSL e pela liderança do partido na Câmara.

“É uma pauta para ter a certeza que o voto de cada brasileiro vai corresponder, na urna, efetivamente à sua escolha, à sua preferência”, avalia Vitor Hugo.

O deputado Rubens Ottoni (PT), por outro lado, aponta que a impressão de votos é um retrocesso. Já que seria mais propício a fraudes e controle do voto do eleitor. O parlamentar diz que, diante do posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF), em 2020, que declarou a volta do voto impresso inconstitucional, a matéria não prospere.

“É uma irresponsabilidade sem tamanho”, diz o deputado que avalia se tratar de uma “jogada para a torcida” do bolsonarismo.

Militância

Para o cientista político, Guilherme Carvalho, a pauta do voto impresso parte de uma desconfiança no sistema eleitoral. A base bolsonarista é movida justamente por esses tipos de desconfianças contra mecanismos institucionais. Neste sentido, volta à tona em um momento delicado para o governo, que é alvo da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga suposta omissão no combate à pandemia.

Guilherme Carvalho avalia que este tipo de pauta mobiliza a militância por ter algo a atacar para além de ter que defender o governo. “A matéria, ao ser pautada pelo governo, entrega algo aos bolsonaristas contra o Estado, contra a classe política ou stababelishment. A militância sai do papel de defesa das acusações e parte para o ataque”, diz.

O cientista político, entretanto, considera que o poder da pauta é limitado, principalmente diante do alto número de mortes na pandemia.

O que é

A PEC 135/19 estabelece que uma cédula seja impressa após a votação eletrônica, de modo que o eleitor possa conferir o voto antes que ele seja depositado, de forma automática e sem contato manual, numa urna trancada para auditoria.

A comissão que analisa a matéria na Câmara é composta na maioria por apoiadores bolsonaristas: deputado Paulo Eduardo Martins (PSC), presidente, Pompeo de Matos (PDT), vice-presidente, e Filipe Barros (PSL), relator.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) lançou na semana passada uma campanha para reafirmar segurança e transparência da urna eletrônica.  Em um vídeo pelo presidente da corte, mostra que todos os passos do processo são auditáveis, seja por instituições e partidos, e pelo cidadão comum, que pode conferir no site do TSE o boletim de cada urna do país.

Roubo no varejo

Hoje principal defensor da impressão de voto, Jair Bolsonaro já foi notícia com nome ligado a fraude em cédulas. Em 1994, o Jornal do Brasil anotou que a juíza da 70ª Zona Eleitoral do Rio de Janeiro anulou 200 votos com urnas preenchidas com caligrafia idêntica. Entre os deputados beneficiados estava o atual presidente do Brasil, que na época disputava eleição para deputado federal pelo PPR.

Trecho do Jornal do Brasil publicado em 1994 sobre fraude nas urnas que cita Bolsonaro