O pano de fundo dos debates é, de um lado, um prefeito com fama de inimigo do Carnaval por ser evangélico, já que nunca foi a um desfile e extinguiu as verbas das escolas de samba –reputação que Crivella nega. Do outro, um governador que vem se aproximando do mundo do samba já de olho no Palácio do Planalto.
O termo de cessão será assinado na próxima semana, com três anos de duração. Mas ele não mexe na gestão da festa em si, que é da prefeitura por lei municipal: “A administração do Carnaval carioca será de responsabilidade exclusiva, direta e intransferível da prefeitura da cidade”, diz a norma.
O acordo foi a forma que eles encontraram para driblar essa lei e ajustar os interesses de ambas as partes. Em troca da cessão, a gestão Witzel vai ressarcir a gestão Crivella por obras de segurança no sambódromo exigidas pelo Corpo de Bombeiros.
A folia por pouco não foi cancelada neste ano por um pedido de interdição do Ministério Público do Rio, que alegou que a avenida não possuía a autorização do órgão para funcionar.
Como não ia dar tempo de o estado fazer uma nova licitação até o próximo Carnaval, eles combinaram que as empresas contratadas pela prefeitura já vão começar as mudanças na próxima semana, com o aval da Promotoria e da Justiça, e depois o governo ressarcirá o município.
As alterações estão previstas para o fim de janeiro e incluem melhorias nas arquibancadas, sistemas elétrico e pluvial, gradeamento e combate a incêndio e pânico.
Elas vão custar R$ 8,1 milhões e serão pagas com as economias da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) –todo ano o governo do estado destina parte de seu orçamento para o Legislativo, e o que não é usado é devolvido.
Esse dinheiro, porém, não inclui obras maiores que vão ficar para o ano que vem, como o alargamento de saídas de emergência da avenida.
A única parte do sambódromo que não vai passar para as mãos de Witzel é o setor 11, espaço tradicionalmente da prefeitura onde a Riotur, empresa municipal responsável pelo evento, pretende receber turistas em 2020, com apresentações e uma espécie de museu do Carnaval.
Esse acordo para a transferência do sambódromo foi definido junto a um outro convênio entre as gestões Crivella e Witzel, para resolver uma rusga antiga que as duas esferas tinham na área da saúde.
O estado prometeu repassar R$ 57 milhões para investimentos e, durante um ano, mais R$ 6 milhões mensais para custeio aos hospitais Albert Schweitzer e Rocha Faria, na zona oeste da capital fluminense, que foram municipalizados em 2016.
O Carnaval da Sapucaí tem passado por incertezas desde o início da gestão Crivella, em 2017. Ele reduziu as verbas das escolas de samba a um quarto do que foi destinado pelo seu antecessor, Eduardo Paes (DEM), e neste ano resolveu retirá-las por completo.
O prefeito tem dito que a festa “é um bebê parrudo que precisa ser desmamado e andar com as próprias pernas”, ou seja, deve ser custeado apenas com recursos privados, já que cobra ingressos da plateia.
Com isso, ainda é incerto quem vai ser responsável pelos gastos com serviços como limpeza, segurança, iluminação e atendimento médico, antes pagos pelo município. A ideia é que fossem os próprios organizadores, mas as ligas de agremiações estão com dificuldades para conseguir patrocínio.
Também não está certa ainda a situação do Grupo de Acesso, aquele que desfila sempre na sexta-feira e no sábado do feriado. A Lierj, liga que reúne essas escolas, chegou a propor à prefeitura deixar de cobrar a entrada para continuar recebendo o subsídio municipal, equivalente a metade das suas receitas.
Já a terceira divisão, cujos desfiles acontecem todo ano gratuitamente na avenida Intendente Magalhães (zona norte), se deu bem. Crivella decidiu triplicar as verbas do grupo neste ano: “São o verdadeiro Carnaval do povo”, disse o prefeito.