Como a jornalista Mariane Ferreira usou a resiliência para superar a perda da filha
A história de como a repórter experiente da Record TV conseguiu usar a resiliência para superar a dor de perder a filha de 7 meses foi narrada no livro A luz da Aurora lançado no início de agosto.
Hoje, quando penso em resiliência, muito mais do que exemplos em livros, recorro à história da jornalista Mariane Ferreira que vivenciou a morte súbita da filha Aurora, um bebê de 7 meses, e mesmo diante de um sentimento profundo de tristeza, ressignificou o seu conceito de vida.
Sempre apresento em minhas aulas uma competência que considero muito necessária para profissionais de sucesso, nos dias de hoje, em que as pessoas estão pouco ou quase nada preparadas para lidar com adversidades: a resiliência.
De acordo com a doutora em Psicologia pela USP Thaís Seltzer Goldstein, trata-se da “capacidade humana de reconstrução positiva frente às adversidades”.
Durante muito tempo, preparei cuidadosamente para sala de aula histórias que geraram muito interesse, comoção e aprendizado sobre como o ser humano pode criar um “movimento de reação e superação, quando o contexto for desfavorável”, mais uma definição da autora Thaís Seltzer Goldstein para o termo resiliência.
Um dos exemplos é o de Viktor Frankl, psiquiatra judeu e austríaco que sobreviveu a quatro campos de concentração na Alemanha Nazista. Na dor, na condição subumana de prisioneiro, o médico perdeu sua esposa grávida, seus pais e um irmão, restando da família apenas uma irmã.
Após a sua libertação, Frankl movimentou-se positivamente escrever livros, dar palestras e fundar a Logoterapia, uma vertente da Psicologia que estuda a busca por sentido. É de Viktor Frankl a frase:
“Quando não podemos mais mudar uma situação, somos desafiados a mudar a nós mesmos.”
Mas quem eu conhecia, como exemplo de uma pessoa próxima que havia passado por um processo de tamanha perda, de dor extrema, que tivesse conseguido reagir à adversidade com desejo e esforço para viver e não para morrer, como a maioria das pessoas poderia pensar?
Então, a vida me apresentou uma das histórias de perda familiar mais tristes que pude conhecer até hoje. A da minha colega de profissão e amiga Mariane Ferreira, que perdeu a filha Aurora, um bebê saudável de 7 meses, por morte súbita no dia 16 de setembro de 2016.
Trabalhamos juntas na Record TV por 6 anos, e, até a minha saída da emissora, em 2012, pude presenciar na gestação dos seus dois primeiros filhos (Caleb e Bejamin) como a Mariane desejou e viveu intensamente a maternidade.
A história de como a morte da menina promoveu uma mudança sem precedentes na vida da Mariane e família foi narrada em riqueza de detalhes e com muita sabedoria pela jornalista no livro A luz da Aurora, lançado no dia 07 de agosto.
Vimos uma Mariane diferente, pela própria dureza da situação, porém transformada em uma pessoa grata pela vida, pela família, pela “oportunidade de ter sido mãe da Aurora” e pelo novo projeto, capaz de inspirar milhares de pessoas que lidam com o sentimento de perda.
Passados alguns dias do lançamento, convidei a Mariane para um almoço e, como sempre, nas vezes em que tivemos a oportunidade de falar abertamente dos acontecimentos daquele “dia mau”, conversamos, nos emocionamos e rimos juntos por horas sem parar.
Então, contei sobre como a sua história serviu para inspirar meus alunos a respeito de como a perda gera grande sofrimento e também pode causar um movimento em direção à vida. E pedi para fazer uma entrevista para o blog e também para o meu livro, que em breve terei o prazer de compartilhar por aqui. Acompanhe na íntegra:
- Na sua opinião, as pessoas estão preparadas para grandes rupturas?
Acredito que não. Hoje existe um aparente desenvolvimento na sociedade, refletido pela tecnologia que tem infantilizado os próprios pais. Os equipamentos eletrônicos são rota de fuga para criar os filhos de uma forma mais fácil. Crianças sem limite e sem afeto se tornam adultos sem valores definidos e emocionalmente doentes e despreparados para vida.
- Você passou por uma experiência de dor que transformou a sua vida e a vida da sua família, que foi a morte da sua filha Aurora tão prematuramente. Como você lidou com esse “marco” e como foi a sua perspectiva para enxergar essa perda?
Nasci em um lar onde os valores da vida eram quase uma regra da criação. Aprendemos a amar, respeitar e ajudar o próximo e a Deus acima de todas as coisas. Logicamente que ninguém está preparado para as perdas, de um filho então… Mas a dor revela quem você é, onde estão os seus valores.
Eu tinha certeza que podia contar com Deus e com o apoio de quem eu amava. Por um bom tempo, muita gente foi meu suporte para continuar. É como amar e sentir amada em uma hora que ninguém espera passar, mas todos nós vamos enfrentar o dia mau, basta saber como, se o que tem valor hoje são as coisas e não as pessoas.
- Existe superação da dor?
Não tenho dúvida… A dor sai da sua mente e desce para o coração em forma de saudade. Superar é uma questão de decisão, seguir em frente e anular da sua vida a opção desistir. É possível e isso não tem a ver com a saudade, essa sim é aprender a conviver com ela um dia de cada vez.
- Se pudesse descrever suas ações para lidar com a realidade, por pior que ela fosse, para “retomar” sua vida, quais seriam essas ações?
Confiar que em tudo existe um propósito. Parar de buscar respostas e crer que o “Autor da Vida” nunca vai falhar. Decidir continuar mesmo quando a vontade era de desistir.
- No livro você relata que as pessoas do seu convívio, como colegas de trabalho, enviaram das mais diversas mensagens tentando consolá-la, em alguns casos, com o intuito de amenizar a morte da Aurora. O que fazer nessa hora, quando geralmente palavras não conseguem traduzir o sentimento da perda? É possível ser empático nesse tipo de situação?
O que se espera das pessoas não são palavras que consolem o inconsolável. A dor é muito grande e, às vezes, a presença e o silêncio são suficientes para que as pessoas que enfrentam a morte possam sentir que não estão só. Atitudes como chorar junto marcam, e às vezes palavras mal ditas causam ainda mais dor.
- Você atuou por quase muitos anos como repórter de TV, mas decidiu fechar o ciclo da reportagem. Por que tomou essa decisão, já que você sempre foi apaixonada em contar histórias de maneira única?
Na verdade, eu fiquei 17 anos na TV. Era algo que amava, até que descobri que meu talento poderia realizar meus sonhos pessoais e profissionais. Agora tinha uma história real, da minha vida, e que poderia viver e me sentir realizada contando de várias maneiras essa experiência de dor, amor e superação.
- O que esse livro representa na sua trajetória pessoal e profissional?
Posso dizer que, pessoalmente, o livro foi como honrar a Deus eternizando o milagre Dele na minha vida. A Aurora deixou um legado em 7 meses ensinando muita gente sobre o amor, a fé e a esperança. Profissionalmente, foi o início de uma nova fase, de um ciclo onde tenho a certeza da realização de sonhos e projetos ousados. Hoje, sei que é possível.
- O que você pode deixar de mensagem para pessoas que não conseguem superar a morte de uma pessoa muito amada?
Superar é decisão. Quem conhece o Pai que tem, não tem medo da vida que pode nos surpreender a qualquer momento. Primeiro é preciso cancelar a opção desistir e aceitar ajuda de profissionais, família, amigos e crer que nada é para sempre, apenas permanecerá a palavra de Deus que nos garante a vitória. Então, é possível continuar e superar tudo nessa vida.