Conheça os impactos da Neurociência na Comunicação e no Comportamento Humano
Na segunda parte da entrevista ao Blog M9, a Dra. Cássia Oliveira aborda estudos de neurometria e orientações sobre como usar a ciência a favor do bem-estar
O assunto Neurociência desperta cada vez mais o interesse tanto da comunidade científica quanto de pessoas curiosas em relação ao tema.
Para trazer um conteúdo de qualidade com base científica e aplicabilidade nas áreas de comunicação, marketing, gestão e comportamento humano, buscamos o auxílio de especialistas com comprovada atuação acadêmica e prática.
Por isso, entrevistei a Dra. Cássia Oliveira, pós-doutoranda em Neurociência. Na primeira parte da nossa conversa, a neurocientista abordou de forma muito didática o funcionamento das estruturas cerebrais, um conhecimento muito válido para quem está começando a estudar Neurociência. Caso você tenha perdido, acompanhe aqui essa verdadeira aula sobre o assunto.
Na segunda parte da entrevista, vamos abordar de que maneira podemos associar os estudos de Neurociência à comunicação interpessoal e às tomadas de decisão.
E resolvemos ainda dar um bônus aos leitores do meu blog: como na prática ferramentas tecnológicas podem ser grandes aliadas ao desempenho de pessoas frente aos desafios no nosso tempo: ansiedade, falta de foco e atenção, problemas emocionais, riscos de doenças cardíacas etc.
Vamos aprender mais sobre Neurociência?
Maraísa Lima – Quais os impactos dessa ciência para áreas como a Comunicação, o Marketing e as Vendas por exemplo?
Dra. Cássia Oliveira – A Neurociência contribui significativamente para as áreas da Comunicação e Marketing com métodos para entender como os indivíduos pensam, agem e interagem com produtos e serviços, as similaridades e diversidades existentes em seu processo de escolha, o que querem, o que pensam, e as influências que existem e afetam suas decisões de consumo.
Tudo isso tendo como foco sua capacidade de obter as informações não declaradas que podem ser capturadas do cérebro para corroborar e agregar às informações comportamentais e as motivações ocultas no inconsciente que direcionam os indivíduos em seu processo de escolha.
A partir dessa compreensão, a Neurociência busca respostas para o entendimento do comportamento, por meio de dados quantitativos de intensidade e respostas a estímulos de reações cerebrais e medições biométricas. Com frequentes medições elétricas do escalpo e respostas visuais da direção do olhar, por exemplo.
Maraísa Lima – Quando eu escolho um produto numa prateleira, e isso ocorre de forma automática, o que explica essa decisão quase “impensada”?
Dra. Cássia Oliveira – A construção da realidade para uma pessoa, como a reação a eventos internos ou externos, se dá de acordo com padrões individuais.
A maioria dos processamentos é inconsciente e a realidade não é objetiva nem subjetiva, e sim fruto da construção de imagens as quais misturam o que acontece no mundo físico (dentro e fora do indivíduo) com o material da experiência anterior acumulada na mente, no decorrer de correspondências neurais no tempo, entre as características dos eventos e o catálogo de respostas disponíveis.
Por trás de toda atitude, existem processos emocionais, cognitivos e fisiológicos (completamente inconscientes) que acabam sendo os influenciadores, já que a tomada de decisão está dentro de cerca de 90% do inconsciente, ou seja, a maior parte do tempo.
Você sabia que do ponto de vista biológico, o cérebro que temos hoje tem o funcionamento idêntico ao do Homo Sapiens de antigamente, nosso antepassado caçador-coletor? Esse cérebro busca a todo tempo preservar sua energia.
Nossas decisões e comportamentos são comandados, em sua maioria, pelo sistema inconsciente, rápido e automático. Esse sistema, quando está em funcionamento, não exige grandes gastos de energia.
Como já disse, 87% a 90% das nossas decisões são baseadas nesse sistema, e costumam ser as decisões mais corriqueiras da nossa rotina, como a escolha de produtos no supermercado, por exemplo, fazem parte desse sistema automático de economia de energia.
Quando as decisões são mais complexas, e exigem mais tempo e raciocínio, o sistema racional é acionado e passa a funcionar.
Marcas acionam sistema automático
Dessa forma, o foco das marcas é direcionado para esse sistema automático, quando o consumidor faz escolhas não racionais no supermercado. Isso só é alcançado quando a marca é notada, reconhecida ou lembrada causando um impacto positivo no inconsciente do consumidor.
Para ser capaz de ser notada, reconhecida ou lembrada em um momento de decisão de compra, a marca precisa criar expectativas positivas no consumidor, e experiências ainda melhores.
Esse é um ciclo porque, quanto mais positiva for a expectativa construída na mente do consumidor, e de igual forma for a experiência que ele tem com a marca, maior será a disponibilidade mental construída, aumentando a memória do consumidor e sua intenção de compra.
Na construção de expectativas positivas, as marcas utilizam narrativas emocionais, memórias associativas, percepção sensorial, destaque atencional e arquitetura de escolha, dentre outras.
Maraísa Lima – Depois de adquirir algo que desejamos muito, é normal ter uma sensação de prazer. Qual é o processo desencadeado depois de uma compra, por exemplo?
Dra. Cássia Oliveira – O circuito cerebral do prazer, também chamado de circuito mesocorticolímbico, é formado por um pequeno grupo de regiões cerebrais nas quais são produzidos os maiores níveis de dopamina.
Esse circuito se ativa quando recebemos estímulos que nos dão prazer, como comer chocolate, fazer sexo, fazer compras etc. Inclusive uma simples ideia pode ativá-lo.
Quando determinada experiência é classificada como prazerosa, ela será posteriormente relembrada e associada a eventos positivos. Um fato que propiciará a repetição da ação no futuro.
Esse circuito pode ser ativado tanto no prazer de comprar como também com substâncias prejudiciais, como a cocaína por exemplo, que está ligada à produção artificial de dopamina no cérebro.
O sistema cerebral de recompensa tem como função garantir a nossa sobrevivência, mas também é uma armadilha para os vícios.
A associação que fazemos de certos estímulos prazerosos pode reforçar a ação, porém se tornando cada vez menos efetiva na busca do mesmo prazer, pois a tendência é acontecer um processo de tolerância a cada sessão de consumo.
Maraísa Lima – Como a Neurociência pode ajudar a tornar a comunicação com outras pessoas mais eficaz?
Dra. Cássia Oliveira – Quando recebemos uma mensagem, nosso Sistema Límbico avalia o conteúdo de acordo com nossas prioridades (se a mensagem é importante, insignificante, agradável, interessante, entediante etc) e só então repassa ao cérebro a informação, associada às emoções – e reagimos em seguida com base nesses dados.
Por isso, deveríamos transmitir nossas mensagens de tal forma que elas fossem percebidas pelo Sistema Límbico do ouvinte como importantes, desencadeando o maior número possível de associações e emoções positivas.
Para tanto, precisamos conhecer o estilo de comunicação e pensamentos do outro. Isso pode ser descoberto nas respostas a um questionário que criei a partir da pesquisa sobre as Quatro Dimensões de Personalidade, que formam estilos de pensamentos e comportamentos que se originam de nossa biologia e estão programados em nosso cérebro antes mesmo de sairmos do ventre.
Mas esse teste, obviamente, não pode ser realizado no dia a dia, mas podemos aproveitar o teor da pesquisa e decidir em que estilo de comunicação eficiente podemos focar.
Quatro Dimensões de Personalidade
Traços de personalidade que são associados a genes específicos no sistema da Serotonina: segurança, cautela, persistência, calma, organização, pontualidade, tradicionalismo, sociabilidade, apreço por rotinas, cumpridores das regras sociais. Esse grupo foi nomeado por mim como meticulosos.
A Testosterona, embora seja associada ao sexo masculino, pode estar presente tanto em homens como mulheres (apenas 7,6%), que são capazes de expressar atividade particularmente forte nesse sistema neural.
Aqueles que herdam essa química tendem a ser: decididos, objetivos, práticos, analíticos, lógicos, realistas, frios, francos, exigentes, emocionalmente contidos, competitivos, audaciosos. Batizei-os de analíticos.
Os traços ligados ao Estrogênio se manifestam em indivíduos sensíveis, afetivos, empáticos, imaginativos, intuitivos, simpáticos, carinhosos, agradáveis, altruístas, emocionalmente expressivos, mentalmente flexíveis, excelentes em postura e gestos, expressões faciais, tons de voz, habilidades sociais executivas, tendentes a ser indecisos. Eu os chamo de reflexivos.
Os traços ligados ao sistema da Dopamina estão associados a impulsividade, flexibilidade mental, criatividade, curiosidade, otimismo, entusiasmo, espontaneidade, alto nível de energia, propensão a correr riscos, buscar constantemente novidades. São os aventureiros.
Enquanto a segurança e estabilidade são importantes para o tipo meticuloso (Serotonina), o sucesso material e o reconhecimento social são muito importantes para o tipo analítico (Testosterona). Para o tipo reflexivo (Estrogênio) a intimidade afetiva tem prioridade máxima. O tipo aventureiro (Dopamina) quer principalmente experimentar algo novo, emocionante.
Exemplo para colocar em prática
De forma prática, vamos supor que você queira convencer um cliente a adquirir determinada tecnologia.
Sua argumentação para um pensador analítico (Testosterona) pode ser a seguinte: “O equipamento reduz a mão de obra em 60%. Com isso, seu lucro anual se elevará x”.
Você deixa um aventureiro (Dopamina) muito motivado da seguinte forma: “Essa tecnologia possibilita a criação de inúmeras novidades...”, ou seja, utilizando as palavras criar, novidade, mudanças etc.
Para aqueles voltados para a segurança, a formulação pode ser mais ou menos assim: “Com essa tecnologia, o risco de interrupção da produção será substancialmente reduzido. Por isso, nós podemos assegurar a nossos clientes que…”
Com argumentações adequadas a cada tipo, é possível aumentar a probabilidade de que o interlocutor tenha um maior interesse para as propostas apresentadas.
Maraísa Lima – Às vezes associamos Neurociência com aparelhos caros e inacessíveis, mas o conhecimento por trás dessa ciência pode ajudar as pessoas mesmo sem a parte de softwares e aparelhos. Gostaria que abordasse práticas simples relacionadas à química cerebral para gerar experiências positivas às pessoas com quem nos relacionamos.
Dra. Cássia Oliveira – Dopamina: ouvir música, ter entusiasmo, comemorar, expressar gratidão, fazer atividade física, relação sexual, recordar bons momentos, trabalhar a criatividade, sentir prazer nas pequenas conquistas e, principalmente, se recompensar depois de conseguir realizar coisas boas.
Efeitos que pode sentir com o aumento desse neurotransmissor: diminuição da procrastinação, aumento da libido e do ânimo, melhora gradual do foco, redução da ansiedade, acionar a memória com mais eficiência e melhor energia (movimento corporal com prazer).
Endorfina: correr pelo menos 3x por semana, dar e receber carinho, fazer planos e cumpri-los, relembrar bons momentos, dar gargalhadas, ser grato, comer chocolate, comer alimentos que trazem lembranças boas, entrar em contato com a natureza etc.
Efeitos: bem-estar, prazer, bom humor, diminuição de dores, dentre outros benefícios.
Oxitocina: Contato físico em forma de abraços, beijos, relações sexuais, massagem, carinhos, praticar boas ações, amamentar, receber elogios, meditação;
Efeitos: Reduz a pressão arterial e os níveis de cortisol, diminui o limiar da dor, reduz ansiedade e estimula diversos tipos de interação social positiva.
Serotonina: tomar pelo menos 20 minutos de sol, manter o sono até a fase profunda, focar no lado positivo das situações, relembrar momentos prazerosos, ser grato, escutar músicas, principalmente as composições de Bach, Chopin, por exemplo.
Efeitos que podem sentir na evolução terapêutica: sensação de bem-estar, redução dos maus hábitos, melhora progressiva do humor, percepção adequada da dor, estimulação motivacional, aumento da capacidade de decisão.
Gaba: Realizar atividade para aumentar a concentração, se “ocupar e não se “pré-ocupar”, diminuir a “pressa” do dia a dia, realizar técnicas de meditação, praticar exercícios respiratórios, etc.
Efeitos positivos: redução da ansiedade, sensação adequada de sono noturno, diminuição excessiva de preocupação, diminuição de quadros compulsivos, sensação de relaxamento.
Acetilcolina: Atividades que estimulem a velocidade do raciocínio, jogos de memória, não consumir alimentos enlatados (pode conter toxina botulínica), cortar automedicação como omeprazol, diminuir exercícios físicos extenuantes, cortar nicotina. Treinamento computadorizado: Variabilidade cardíaca.
Efeitos positivos: aprendizado com mais rapidez, aumento na velocidade de exercícios para raciocínio, diminuição das palpitações cardíacas, aumento dos sonhos.
Maraísa Lima – Entender o funcionamento do cérebro pode ajudar as pessoas a ter uma vida melhor. Uma realidade muito frequente na sociedade hoje é a falta de foco, atenção, estresse, problemas emocionais e a baixa motivação com atividades da vida pessoal e profissional. Nesse caso, a tecnologia e a neurociência podem ajudar a proporcionar uma vida melhor às pessoas?
Dra. Cássia Oliveira – Sim. A boa notícia é que o que era utilizado apenas em laboratórios de pesquisas e posteriormente para um público muito restrito, devido ao acesso e alto custo, atualmente temos tecnologias acessíveis à população. Uma delas é a Neurometria Funcional, que estou utilizando em um dos maiores estudos nos EUA sobre o cérebro dos adolescentes, como também utilizo clinicamente em meu consultório.
A Neurometria Funcional (neuro= neurofisiologia; metria= medida, captações de sinais fisiológicos) é uma metodologia que constitui uma associação de técnicas e procedimentos mundialmente reconhecidos que focalizam a interação entre o cérebro, mente, corpo e comportamento, tendo uma lista de possibilidades como:
– Análise Funcional do Sistema Nervoso Autônomo, Neuroimagens, Gerador de Ondas Cerebrais, Indutor de Ondas Cerebrais, Predomínio de Ondas Cerebrais, Ressonância Neural Transcraniana, Ajuste Cognitivo, Biofeedback, Neurofeedback, Mapeamento Cerebral (EEG/MC), EMG, Resposta Galvânica, Exames laboratoriais para neurofisiologia.
Diagnósticos sugeridos
Por meio de exames e análises computadorizadas, que permitem investigar as deficiências neurofisiológicas, cito alguns diagnósticos sugeridos:
- Transtornos de ansiedade, depressão, distresse;
- Estresse adrenal;
- Hiperatividade, déficit de atenção;
- Deficiência da reserva funcional;
- Intolerância alimentar (níveis: leves, moderado, severo);
- Variabilidade cardíaca disfuncional; déficit cardíaco;
- Transtornos digestivos: alterações de peso, metabolismo lento, fadiga crônica;
- Tensão, disfunção emocional; dentre outros.
Terapias sugeridas
Modulação neurofisiológica, controle do ritmo cardíaco na prevenção do infarto e AVC, performance pessoal, esportiva, desempenho cognitivo, foco, atenção, habilidades e competências.
Duração do tratamento
O conteúdo do programa de tratamento da Neurometria respeita o tempo mínimo de maturação do sistema nervoso (média de 3 meses), levando ao sucesso clínico na geração de um Engrama (uma nova sinapse é criada com um novo aprendizado positivo).
Nosso objetivo é melhorar a saúde física e mental, com foco no desempenho cognitivo e comportamental, levando ao bem-estar e trazendo alívio para as questões emocionais, proporcionando assim uma boa qualidade física nas atividades diárias da vida.
Evolução do tratamento
Semanalmente, a cada novo exame ou treinamento, é possível comparar o grau de melhora e evolução em cada um dos pilares analisados pela tecnologia.
Pilares da Neurometria Funcional
1º PILAR. Cognição, Comportamento e Emoção por Neuroimagens:
Quando relacionamos neuroimagens com transtornos de ansiedade (estresse, fobias, pânico, ansiedade generalizada, hiperatividade, bruxismo etc.) e transtornos do humor (depressão, bipolaridade, apatia etc.), podemos notar comportamentos cerebrais característicos, que podem ser visualizados e diagnosticados com o uso da tecnologia.
Além do diagnóstico, como tratamento complementar, essas regiões alteradas do cérebro são tratadas modulando os pulsos cerebrais específicas. Assim, o paciente poderá entender e aprender a correlacionar suas emoções, sentimentos e pensamentos com as imagens ao vivo do seu cérebro em 3D.
Também são realizados treinamentos com diversos protocolos neurofisiológicos, como: (variabilidade cardíaca, temperatura periférica, oxigênio funcional, fluxo sanguíneo etc.), com o objetivo do equilíbrio do sistema nervoso autônomo.
2º PILAR. Reserva Funcional (matéria-prima utilizada para produzir neurotransmissores, hormônios, sistema imune ativo) ou Deficiência Nutricional:
É avaliado o nível de Reserva Funcional por meio da avaliação neurofisiológica, uma eficiente ferramenta para que o paciente reorganize em nível funcional uma alimentação saudável e diminua significativamente as possibilidades dos distúrbios funcionais.
3º PILAR. Distúrbios Cardiovasculares e Cardiocerebrais:
A Neurometria apresenta programas de tratamento, proteção e prevenção de doenças cardiovasculares, por meio de um modelo cardiofuncional computadorizado.
A ciência aponta resultados positivos após um período de trinta dias de treinamento, em relação a doenças como hipertensão, infarto e AVC.
Pesquisas mostram que os treinamentos da variabilidade do sistema nervoso, reduziram significativamente palpitações, ansiedade, dores, insônia, tensão física, cansaço e disfunção no metabolismo, tudo que afeta o coração.
4º PILAR. Cérebro e o Sistema Digestivo (Reações alimentares, intolerâncias, disbioses – desequilíbrio da flora intestinal – e transtornos ligados à emoção):
Sabe-se hoje que alimentos específicos alteram negativamente os dados dos gráficos neurofisiológicos (correlacionando as reações alimentares ao sistema nervoso), o que atinge regiões específicas do cérebro. O programa identifica em tempo real na tela do computador essas reações.
O conjunto das ações dos 4 Pilares apresenta um impacto significativo no desempenho físico e mental, memória, raciocínio, concentração, disposição no trabalho e nos estudos.
O cérebro e toda sua estrutura funcional está relacionado à variabilidade do funcionamento do sistema nervoso, imunológico e metabólico. Dessa forma, quanto maior e melhor essas variabilidades estiverem, mais funcional e adaptativo esses sistemas estarão.